Chineses alteraram a traça do edifício e levaram consigo o segredo
O desmaio do antigo governador do Banco Nacional de Angola
(BNA), Valter Filipe, no primeiro dia do julgamento do “caso 500 milhões” não
tem “ciência” nenhuma: decorreu das condições do edifício do Palácio da
Justiça, à rua 1.º Congresso do MPLA, onde se acha o Tribunal Supremo, entidade
que julga os quatro acusados de defraudar o estado angolano. Os outros são José
Filomeno dos Santos “Zenu” e Jorge Pontes Sebastião e António Bule.
O problema é que o edifício, concebido na época
anterior à independência nacional, viu a sua traça original alterada, depois
que a construtora chinesa China Jiangsu, terminou a obra deixada a meio pela
administração portuguesa.
Originalmente, como de resto a governação fez com
outros edifícios – atente-se ao caso do da Fazenda e Contabilidade, actual
Ministério das Finanças – o agora Palácio da Justiça não contemplava a
instalação de aparelhos de ar condicionados, nem de uma central de refrigeração
por causa da boa circulação de ar na área. Ao dispensar esses aparelhos, os
engenheiros de então obedeceram aos mesmos critérios que presidiram a
construção do Liceu Salvador Correia, hoje Mutu Ya Kevela, situado numa área
cuja circulação de ar dispensa(vá) o ar gerado artificialmente.
Como disse o luso-angolano Troufa Real, um dos
arquitectos do edifício original, com o actual Palácio da Justiça “eu ra um
edifício caracterizado pela chamada arquitectura tropical, com zonas de
protecção solar, 12 salas de audiência e salas de espera ao ar livre protegidas
do sol, jardins e estacionamento”.
Além da alteração da traça inicial, os chineses
introduziram no edifício um sistema centralizado de ar condicionado, porque a
circulação do ar está agora dificultada por construções em zona inicialmente
livres e concebidas exatamente para que o ar circulasse sem restrições. O
luxuoso bairro da Sodimo na Chicala II, assim como o novo edifício Assembleia
Nacional obliteraram a circulação do ar, com o que transformam oem verdadeiras
saunas os compartimentos do edifício onde está o Tribunal Supremo.
Acontece, porém, que o sistema centralizado de ar
condicionado está avariado há mais de um ano e não há perspectiva de reversão
do quadro. Isto porque a empresa China Jiangsu, que tratava também da
manutenção do edifício, foi posta a andar, tendo por receber uma dívida
milionária de anos anteriores. Como retaliação, os chineses levaram consigo
todos os segredos ligados ao sistema de refrigeração. Empresas angolanas e até
mesmo estrangeiras chamadas para reverter a situação não têm dado conta do
recado.
Resultado: o Palácio da Justiça se assemelha a um
forno. Em dias em que a temperatura sobe bastante, no interior do palácio a
sensação é de que um ovo não precisaria de fogo para cozer.
A situação é tão grave que todos, incluindo o
presidente do Tribunal Supremo, trabalham com janelas abertas para que não suem
em bicas e não desmaiem. Por isso, é enorme a rarefação do ar, poluído com
toneladas de dióxido de carbono, visto que aquela é uma das áreas mais
movimentadas da cidade. Centenas de “candongueiros”, geralmente sem as
necessárias condições técnicas para circularem na cidade, demandam a rua onde
se acha o prédio. Além do fumo, poeiras e mosquitos adentram as janelas do
Palácio da Justiça.
Foi, pois, por falta de Ar Condicionado (AC) e
devido a deficiente Circulação do Ar (CA) que Valter Filipe não resistiu. E
isso é algo que pode acontecer com qualquer um, sobretudo se hipertenso e se
estiver sob pressão, o que é o caso. Portanto, não há truque nenhum do antigo
governador do BNA e o episódio pode repetir-se.