Manuel Júnior, o indemissível de JL

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Em alguns círculos, a demissão do ministro de Estado da Coordenação Económica, Manuel Júnior, já era tida como inevitável.
Dir-se-ia que apostas eram feitas não sobre a inevitabilidade da saída, mas sim sobre o timing em que ocorreria.
O ministro da Coordenação Económica suscita leituras diferentes. Nos meios académicos é tido como tecnicamente fraco.
“Desconhece a realidade (entre a economia real e a formal). Tem aversão em trabalhar com técnicos brilhantes e bons”, disse ao Correio Angolense um professor da cadeira de Economia do Desenvolvimento da Universidade Católica de Angola.
Pedindo para não ser identificado, um conhecido empresário angolano, conhecido pelas suas ligações muito estreitas com os mais influentes membros do Executivo, resumiu assim as qualidades de Manuel Júnior: “É excessivamente académico, esquivo e não tem tarimba”.
Um outro empresário, com bastante expressão, tem uma perspectiva mais benevolente de Manuel Júnior.
“Quanto a mim as principais falhas dele são de liderança e gestão efectiva. Quem tem essas qualidades dá orientações do que deve ser feito, estabelece a cronologia e cobra a execução in time. Mesmo quando mostra domínio teórico dos problemas, Manuel Júnior não acompanha, não exige a execução atempada das tarefas, mesmo quando são urgentes”.
De acordo com esse empresário, Manuel Júnior está “muito condicionado pelo cumprimento dos objectivos acordados com as organizações internacionais. Aliás todos eles estão atados e sem autonomia ou sem capacidade de procurar alternativas. O próprio boss dele também está condicionado”.
Para o empresário, que falou na condição de não ser identificado, os compromissos com organizações internacionais que têm manietado o próprio Presidente da República, impedindo-o de fazer as mudanças que a sociedade reclama.
“Na minha opinião, o Presidente está atado a soluções que não vão funcionar. Para funcionar, é preciso que os senhores da Marginal e da Mutamba olhem para além do quadrado. A função do Estado de assistência social às famílias e aos trabalhadores sob a forma de emprego é sacrificada em benefício do pagamento da dívida externa”.
Entre os jornalistas, Manuel Júnior é dos governantes menos apetecíveis : raramente – ou quase nunca – produz afirmações que sustentem uma boa “cacha”.
Enfim, num contexto em que a nossa economia, afectada pela crise do petróleo e pelo surgimento da pandemia do coronoa vírus, tomba para a esquerda e para a direita, para frente e para trás, sem quaisquer sinais de equilíbrio, o ministro de Estado da Coordenação Económica é uma rara “unanimidade”: o patinho feio do Executivo.
Mas, quando em muitos círculos já se contavam os dias que faltariam para que Manuel Júnior transpusesse a porta de saída do Executivo, eis que em duas decisões quase seguidas o titular do Poder Executivo renovou a confiança no coordenador da equipa económica.
Através do Decreto n.º 144/20, de 26 de Maio passado, o Presidente da República aprovou o Estatuto Orgânico da Unidade de Monitorização e Acompanhamento de Projectos do Executivo (UMAPE), uma unidade de “apoio ao Titular do Poder Executivo, a quem compete a monitorização de projectos do Executivo através de um Sistema Integrado de Monitorização de recolha, compilação, organização e prestação oportuna de informações de apoio ao processo decisório”.
Integrada na Administração Directa do Estado, a UMAPE monitora os projectos inscritos no Programa de Investimentos Públicos de modo “a prestar informações fidedignas e oportunas ao Titular do Poder Executivo” com o que possibilita um “processo célere, oportuno e conveniente de tomada de decisão que garanta a boa execução das políticas públicas”.
O novo “filtro” do Titular do Poder Executivo é dirigido por um Conselho de Coordenação em cuja cabeça foi colocado Manuel Júnior. Sem dúvida, uma manifestação de confiança.

Manuel Nunes Jr., a aposta do Presidente da República

No dia 29 de Maio, o Presidente da República disse que o diálogo regular existente entre o Executivo e as Associações Empresariais já permite que se evolua “rapidamente para a criação do Conselho de Concertação Económica (CCE) que integre renomadas figuras da economia, do direito, da sociologia, empresários e outros”.
A criação de uma tal entidade justifica-se porque “estamos todos convocados, o Executivo, a classe empresarial, as Universidades e todos aqueles que queiram contribuir com seu talento, seu saber e seu trabalho para que a estrutura económica de Angola seja definitivamente alterada, de modo a que o sector não petrolífero tenha um maior peso no PIB, na captação de receitas fiscais e de recursos externos para o país”.
Nesse encontro, João Lourenço disse que por parte do Executivo, o ponto focal do futuro Conselho de Concertação Económica (e Social, segundo defende, insistentemente, o académico José Octávio) seria o ministro da Coordenação Económica, que vem a ser exatamente Manuel Júnior.
Isto é, quase tido como descartável, o ministro da Coordenação Económica recobrou fôlego com duas claras e inequívocas provas de confiança. Em pouco tempo, Manuel Júnior voltou a perfilar-se entre as principais apostas de João Lourenço.
Ser ponto focal do futuro CCE, que, sem dúvida, se transformará no maior órgão de consulta do Chefe de Estado, é uma robusta prova de confiança.
Os dois gestos fazem de Manuel (Nelito) Júnior o indemissível na equipa de João Lourenço. Esses gestos são, inversamente, um revés a todos aqueles que torcem pela demissão do MEEC por verem nele um entrave, um “atraso de vida” para a recuperação económica do país.
Depois dos dois sinais que transmitiu à sociedade, o Presidente da República precisa de colocar a si mesmo a seguinte reflexão: antes da COVID-19, a economia não atava nem desatava. Será que a mesma pessoa que sugeria e decidia servirá para um contexto mais complexo?
Do actual elenco governativo, constituído por 21 ministros e 45 secretários de Estado, apenas três ministros sobreviveram a todas as mexidas efectuadas por João Lourenço. São eles o próprio MECE, Manuel Jr, o ministro da Energia e Águas, João Baptista Borges e eminência parda do PR, Edeltrudes Costa, o chefe do gabinete de João Lourenço. Vindos lá de trás, do tempo de José Eduardo dos Santos, coincidentemente, é sobre o trio que recaem as mais ácidas críticas da sociedade.
Manuel Jr. é contestado pelo suposto cinzentismo intelectual; JB Borges é questionado não apenas pelas reiteradas, mas nunca cumpridas, promessas de completa electrificação do país ( exercício que ele repete a cada ciclo eleitoral), como por negócios escusos envolvendo não apenas o Ministério de Energia e Águas como familiares. Ao director do gabinete de João Lourenço os críticos questionam a idoneidade moral, já que o seu nome é frequentemente associado a negociatas que culminaram em enriquecimento sem justa causa.
O Presidente da República não pode, por conseguinte, repartir com ninguém as responsabilidades pelos acertos, poucos, e desacertos, muitos, dos colaboradores a quem ciclicamente renova a confiança.