Privatizações para cobrir folha de salários do Estado

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O país passa por sérios apertos financeiros, o que obrigou a venda de alguns activos para cobrir a folha de salários do Estado. A situação é tão grave que nos últimos meses parte substancial dos ordenados da função pública tem sido paga com a ajuda do INSS 

Nos últimos meses o presidente da República, João Lourenço, autorizou a privatização de uma série de activos do Estado em distintas empresas. O chefe de Estado avalisou já a alienação parcial ou total de várias entidades públicas, sendo das mais recentes a Empresa de Seguros e Resseguros de Angola (ENSA) e a participação do Estado no banco Caixa Angola. Até a poderosa foi “obrigada” a desfazer-se de parte que detém no Banco Angolano de Investimento (BAI).

Esta cascata de privatizações surge depois de falhada a alienação de várias empresas detidas pelo Estado – maioritariamente pela Sonangol – na Zona Económica Especial (ZEE) de Viana. No empreendimento erguido pelo Gabinete de Reconstrução Nacional são 52 as empresas postas à venda há já alguns anos, mas só cinco (!) foram vendidas, no período designado como primeira fase. A segunda fase iniciou há pouco tempo, com 13 fábricas à venda, mas, passado quase um ano, nenhuma foi “despachada”. 

De acordo com o que disse ao Correio Angolense fonte do Instituto de Gestão de Activos e Participações do Estado (IGAPE), entidade que lidera o processo de alienação, várias razões concorrem para o desinteresse generalizado na aquisição das empresas situadas na ZEE. A principal tem a ver com os preços. Uma outra é a obrigação imposta aos candidatos a compradores de absorver a toda a força de trabalho, mesmo nos muitos casos em que, comprovadamente, há má mão de obra excessiva.  

Com a venda dos activos do Estado o Governo previa a arrecadação de largos milhões de dólares, que lhe permitiriam ficar desafogado por algum tempo. “Havia previsão de encaixe de uns bons milhões de dólares, mas os resultados foram quase pífios, muito aquém do esperado. Há já quatro anos foram colocadas várias fábricas à venda, mas até agora pouquíssimas foram vendidas e isto exerce grande pressão sobre o sector empresarial do Estado”. 

Os activos do Estado na Zona Económica Especial de Viana não são suficientemente atractivos

As privatizações estão alinhadas com a estratégia governamental  de  redução do papel do Estado como player na economia, deixando o espaço que é por natureza do sector privado, numa genuína economia de mercado. De resto, em Fevereiro passado o presidente da República, João Lourenço criou uma comissão de preparação e implementação do processo de privatização em bolsa das principais empresas públicas, coordenada pelo ministro de Estado e do Desenvolvimento Económico e Social, Manuel Nunes Júnior. De acordo com o Programa de Privatizações, 195 entidades públicas serão alienadas parcial ou totalmente num processo iniciado em 2019 e que vai até 2022, estando na lista “colossos” como a ENDIAMA, a TAAG e a Cuca.

De acordo com as fontes do Correio Angolense, embora as alienações obedeçam ao propósito de consumar a redução do papel do Estado como actor empresarial e, por outro lado, “maximizar as receitas para o Estado”, como refere o documento que criou a comissão liderada por Manuel Júnior, há razões de força maior que determinaram a aceleração do processo nos últimos meses: a combinação dos efeitos da pandemia da Covid’19 que assola o Mundo e a acelerada depauperação dos cofres públicos. “Os cofres públicos precisam urgentemente de fôlego”.  

Apesar da urgência do Governo de arranjar dinheiro, o mercado não está a acompanhar essa necessidade.

“O momento não parece ser o mais apropriado para transações do género. O mercado está retraído e a generalidade das empresas espera para ver o que vai acontecer, preferindo não arriscar já”.

A fonte do Correio Angolense reitera que sem injecção de dinheiro nos seus cofres o Estado não conseguirá honrar os seus compromissos e deu como exemplo o que se tem passado nas últimas semanas: “parte nada negligenciável dos salários dos últimos dois meses foram cobertos com o dinheiro que o INSS tem no Banco de Poupança e Crédito (BPC) e, se o quadro não for invertido proximamente, daqui a poucos anos não haverá dinheiro para pagar os aposentados”.