O filme americano Love, Fall & Order, dirigido por Clare Niederpruem, com guião de Audrey Shulman e as estrelas principais Erin Cahill, Trevor Donovan e Gregory Harrison, passou domingo à tarde no canal FOX Life. Uma cena muito colorida do filme é a montagem do festival Fall, festa em homenagem à queda das folhas avermelhadas das árvores no Outono.
É incrível como os cidadãos dos países desenvolvidos se dedicam a organizar, em espírito comunitário, festivais para honrar as folhas que caem das árvores, enquanto nós destruímos, vendemos as florestas ou queimamo-las no Cacimbo, para extrair carvão.
Se Angola fosse um pais normal, depois de 45 anos de independência, estaríamos num domingo como esse em que passou o filme na FOX, no jardim do Alvalade, pais e filhos, famílias, jovens namorados a passear alegremente, ao som do canto das cigarras e rabos de junco.
Assim que acabar esta calamidade da Covid-19, estará tudo montado para o Festival do Cacimbo em Angola, uma festa que nos vai aproximar um poucochinho mais, despidos das nossas diferenças sociais, das nossas makas antigas que não servem, nem nunca serviram, para construir uma Angola de todos e para todos os angolanos
Se Angola fosse um país normal, depois de 45 anos de independência, estaríamos ali na Floresta da Ilha, aos fins-de-semana, a fazer piqueniques, com as marmitas cheias de refrescos e o riso, o riso, o riso alegre do povo que faz a razão de ser país.
Se Angola fosse um país normal, depois de 45 anos de independência, cada bairro teria a sua zona verde, com uma clareira para as crianças brincarem aos sábados e domingos, e os professores organizarem excursões para os seus alunos tocarem na casca das árvores e respirarem o oxigénio que elas lançam na atmosfera.
Se Angola fosse um país normal, depois de 45 anos de independência, cada criança devia plantar uma árvore na sua casa, como parte da educação formal.
Se Angola fosse um país normal, depois de 45 anos de independência, deveríamos, com imenso amor pela pátria, poder organizar com os nossos camponeses um Festival do Cacimbo.
Com um Festival de Cacimbo, os nossos camponeses teriam uma oportunidade de conversar com os nossos peritos florestais do ministério da Agricultura sobre a protecção do ambiente e da natureza. Teriam a oportunidade de dançar e cantar as suas tradições à noite, à vota da fogueira, e os poetas e contistas poderiam recolher muito desse património intangível.
Com um Festival do Cacimbo, os artistas e poetas das cidades dariam encontro com os povos do interior e mostrar-lhes-iam a arte urbana, levariam consigo alguns livros para oferecer lá nos nossos kimbos e seria uma festa da unidade nacional.
Um Festival do Cacimbo em Angola poderia prevenir os vídeos das enormes queimadas que recebemos anualmente no telemóvel. Um Festival do Cacimbo poderia aproximar mais os dirigentes dos dirigidos. Poderia levar mais sorrisos às faces das crianças.
Um Festival do Cacimbo em Angola far-nos-ia desviar deste rumo em que estamos a prosseguir, nos perseguindo uns aos outros desde o tempo do maquis e da Independência até hoje, o rumo do MEDO de ser angolano, o rumo da INIMIZADE interna, da juventude sem horizontes, da mulher sempre desgraçada na zunga.
Porque este rumo, camaradas, é um rumo que já deu tudo o que tinha para dar. Este rumo do controlo obsessivo do pensamento intelectual, da negação das ideias inovadoras como as do rio Luanda, da justiça para o pobre, do combate contra a malária e as doenças diarreicas, do apoio ao camponês, do retorno ao campo, da qualidade do ensino, da honestidade intelectual dos nossos dirigentes, da elevação da MORAL e da ÉTICA na governação, do fim da barbaridade policial, este rumo da negação das propostas da sociedade civil, meus camaradas, cansa, deprime, leva-nos a fugir deste belo país.
Porque este rumo, camaradas, já não dá, nem pode dar frutos. Deste rumo só brotam choros, lágrimas de mãe pobre perante o cadáver do filho desnutrido. Deste rumo só brota o conformismo, a resignação de um povo heróico e generoso, sacrificado na guerra pela independência, nas guerras civis e intrapartidárias e na guerra social do Capital acumulado de forma anacrónica e primitiva. É muito tempo de guerra acumulado.
Que o ministro da Justiça saia de manhã, sem o fato e a gravata, num carrito pequeno e visite as periferias. Vai ver como é mandado parar pela Polícia, por razões que envergonham os angolanos. O nosso comportamento agressivo, 18 anos depois do fim da guerra civil, deve ser objecto de um congresso. Com políticos, psicólogos, médicos, intelectuais, religiosos e pessoas do Povo. Porque nos perseguimos assim, sem mais nem menos? Como reverter este quadro de falta de amor e de respeito pelo OUTRO?
O Festival do Cacimbo deve começar já a ser preparado nas mentes dos angolanos. O lema só pode ser o Artigo 1.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem: “TODOS OS SERES HUMANOS NASCEM LIVRES E IGUAIS EM DIGNIDADE E EM DIREITOS. DOTADOS DE RAZÃO E DE CONSCIÊNCIA, DEVEM AGIR UNS PARA COM OS OUTROS EM ESPÍRITO DE FRATERNIDADE.”
Assim que acabar esta calamidade da Covid-19, estará tudo desenhado, orçamentado e montado para o Festival do Cacimbo em Angola, uma festa que nos vai aproximar um poucochinho mais, pobres e ricos, velhos e crianças, homens e mulheres, os da oposição e os da situação, os da força e os sem força, todos nós, desta imensa Angola, despidos das nossas diferenças sociais, das nossas makas antigas que não servem, nem nunca serviram, para construir uma Angola de todos e para todos os angolanos.