A narrativa dos tarefeiros ruiu

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Moco foi vítima da  intolerância política do Presidente João Lourenço

Eles próprios aparentemente apanhados com as calças nas mãos, os  “tapa buracos” do Presidente da República depressam atribuíram a defenestração de Marcolino Moco, do Conselho de Administração da Sonangol, do qual era administrador não executivo, a pedido de demissão do próprio.

Seguindo a narrativa então posta a circular, Moco tomou a iniciativa de se demitir por não se identificar mais com as políticas de João Lourenço.

Ao portal Club-K, os “tapa-buracos” do PR, ou seja, os homens que se voluntariam para amortecer as sucessivos e inquietantes tombos de João Lourenço, “venderam” a ideia de que o afastamento de Marcolino Moco é reflexo de promessas feitas por altura da sua tomada de posse alertando que se demitia da petrolífera estatal caso observasse incumprimento de promessas eleitorais por parte da governação de João Lourenço”.

“Se João Lourenço não cumprir as suas promessas, eu demito-me”, teria dito Moco à revista “Jeune Afrique” por altura da sua nomeação. 

Sucede, porém, que os tarefeiros de João Lourenço construíram a sua narrativa à revelia do próprio Moco. Melhor, não combinaram com o Moco os termos dessa narrativa.

“Doutorados”  e “especializados” no convencimento de que não importa o que outros pensam, os diligentes tarefeiros do Presidente da República criaram, para justificar a surpreendente decisão de João Lourenço, uma narrativa compatível com os seus interesses. Só que, repete-se, não consultaram e nem concertaram nada com Moco.

E o resultado  – muito embaraçoso para o Presidente da República  – está aí. 

(…) antes que outras mil e tantas conjecturas sejam alvitradas, vou explicar, para quem ainda não o apreendeu ou mal o apreendeu, o significado da minha exoneração – com algumas encenações laterais forjadas – de um cargo que me foi pedido para aceitar, com alguma insistência. Sobretudo a forma como foi feita (a exoneração), para que ninguém fique com dúvidas, pelo menos sobre o meu entendimento sobre o assunto”, é assim que MM inicia a sua versão dos factos.

Como a maioria dos cidadãos, o antigo primeiro-ministro diz que soube da sua exoneração através comunicação social. 

“Justo há uma semana, estava eu a sentar-me para tomar a primeira colherada de sopa (…) quando vejo o inacreditável no telejornal da TPA; mais ou menos assim: Presidente da República remodela CA da Sonangol; decretos: exonera tal….tal … e tal executivos e Marcolino José Carlos Moco, não executivo; e nomeia tal….. tal ….tal (…)”.

Surpreendente para a maioria da ralé, Moco, porém, garante que a decisão do Presidente não o apanhou desprevenido. 

“Se fui avisado? Sim fui, em certa medida. A primeira vez, aí por volta de fins do primeiro semestre do ano passado, por um alto funcionário da Sonangol (…) mas de quem não esperaria tal intermediação, para me admoestar, com todo aquele pequeno respeito, que eu deixasse de referir que estava desiludido com a governação do Presidente João Lourenço. Isso fora depois de uma entrevista dada ao Novo Jornal, em que o jornalista tinha ‘ajindungado’ um pouco o título. E eu respondi, também muito delicadamente, que a crítica não era dirigida contra a governação, no sentido tão estrito, mas sim ao sistema geral de condução política que afinal o novo Presidente parecia não querer alterar. E dei exemplos com os quais o intempestivo fulano pareceu concordar. O segundo aviso saiu aquando daquele post em que falei do ‘regresso aos métodos autoritários’. Aqui a coisa foi já um pouco mais sinistra, porque veio de uma mensagem privada em FB, ‘assinada’ por um, certamente heterónimo, que depois se retirou. Este que perguntava se apesar de toda a dinheirama e mordomias eu ainda não me sentia acomodado. Curioso recordar que uns dias antes tinham sido atribuídos, especificamente aos administradores não executivos da Sonangol, salários muito bem longe da realidade, por fofocas dentro e fora das redes”.

Desmontada a narrativa dos tarefeiros de que foi Moco pediu a sua demissão, sobra exclusivamente a mais razoável das explicações, a estabelece um linkage entre a defenestração do antigo-ministro e as sua recente posição sobre um pronunciamento do Bureau Político do MPLA. O próprio Moco  também acredita que a sua demissão não foi alheia àquela posição.  

Bom, aquilo de que estamos a falar agora, coincidência ou não, acontece depois dos meus últimos dois posts aqui, sobre posições supostamente do BP do CC do MPLA e orientação de certos programas da nossa TV pública, criticadas por vários outros camaradas da chamada ‘família MPLA’ (…)”.

Na sua conta no Facebook, Moco manifestou-se contrário ao comunicado do Bureau Político do MPLA do dia 5 de Fevereiro, que basicamente visava o líder da UNITA, Adalberto da Costa Júnior.

Moco classificou como “bullying racista e xenófobo” o discurso insinuando que o líder da UNITA não seria angolano. O ex-secretário geral do MPLA manifestou a sua preocupação com o facto da declaração do partido no poder ter deixado implícito o apoio à campanha em curso nas redes sociais contra o líder do principal partido da oposição, que é acusado de não ser angolano. O protesto de Moco opõe-se também ao que  classifica como “o regresso da política de desqualificação gratuita” de “figuras ou organizações políticas, pela via mais baixa possível”.

Abandonado pelos seus tarefeiros, o Presidente da República arca, sozinho, o peso de haver demitido Marcolino Moco por intolerância política.