Embora mandada construir pelo Ministério das Obras Públicas, a administração do Distrito Urbano do Benfica não deveria, porém, eximir-se da responsabilidade de cuidar da manutenção de um equipamento social que atende, prioritariamente, a população local.
Mas a verdade é que – e como dizem os brasileiros – a administração do Benfica não “está nem aí” e o que se vê é o resultado do descaso: falta de componentes essenciais e degradação contínua. O posto policial ali existente não tem inibido a sua depredação.
Diariamente centenas de pessoas servem-se do conhecido calçadão de Benfica, no distrito urbano homónimo. Geralmente, o local é demandado pelos usuários às primeiras horas da manhã ou no final do dia para ali desenvolverem actividade física de manutenção. No local, misturam-se pessoas de diversas faixas etárias, sejam crianças, adolescentes, jovens, gente de meia-idade e pré-idosos. Em regra, os mais adiantados na idade aparecem só ou acompanhados de um ou dois companheiros. Os jovens fazem-no comumente em grupos mais numerosos, organizados para sessões de ginástica (aeróbica e ou anaeróbica) e musculação, conforme as circunstâncias.
À beira-mar plantado, o equipamento social dispõe de uma ciclovia, espaços com aparelhos fixos para musculação e quatro quadras desportivas, sendo três de basquetebol e uma de andebol e futsal. Enquanto as primeiras são geralmente usadas para desporto de recreação, a última acolhe um núcleo de andebol (no período da manhã) e jogos lúdicos de andebol e futsal (entre o fim da tarde e princípio da noite).
Concluído em finais de 2015 pela construtora brasileira Queiroz Galvão, o espaço carece de elementos informativos essenciais para os utentes. Um dos quais é a falta de sinalização métrica da pista para ciclistas e da via paralela usada por caminhantes. Sem marcações no piso, ninguém sabe às quantas anda em matéria de quilometragem, a menos que se faça acompanhar de um relógio com múltiplas funcionalidades (os conhecidos smartwatch ou relógios inteligentes).
Em piscinas públicas, por exemplo, muitas mortes são evitadas com a simples informação da profundidade inscrita na borda, nos seus diversos pontos. Em função desses “esclarecimentos”, os utentes sabem onde mergulhar para não correrem risco de vida, na eventualidade de não saberem nadar. No Calçadão ninguém se afoga, mas a marcação da pista podia evitar excessos de pessoas que não devem caminhar mais do que o recomendado pelo médico…
Não menos preocupante para os indivíduos que buscam no espaço qualidade de vida e melhor saúde por via do exercício físico é não haver uma pista demarcada especificamente para caminhantes, ao contrário da reservada a ciclistas, que está bem sinalizada. Por isso, bicicletas e andantes disputam praticamente o mesmo espaço, com os riscos daí advenientes. Afinal, partilhando ambos a mesma área de exercício, acidentes podem acontecer a qualquer momento.
Outra pecha imperdoável é a falta de relógios públicos, como há, por exemplo, em várias orlas de cidades costeiras pelo Mundo afora, sendo exemplos disso mesmo Lisboa ou Rio de Janeiro, aonde muitos governantes angolanos vão mexer o esqueleto durante o carnaval e não só. Esse tipo de equipamentos é nos dias de hoje muito mais do que apenas um marcador de hora, oferecendo múltiplas alternativas que permitem soluções para cada situação de aplicação. Ou seja, marca horas, indica a temperatura ambiente, assinala o nível da maré e das ondas, a velocidade do vento e, dependendo da capacidade, pode até passar informação de utilidade pública. É que, apesar de possuírem smartwatches ou smartphones, muitos utentes caminham ou pedalam despojados de quaisquer adornos. Quando muito, se fazem acompanhar de pequenos reprodutores de música e os respectivos auriculares…
Por ocasião da entrega da obra às autoridades centrais, o valor da mesma não foi não foi tornado público. Mas conhecendo o país como conhecemos – por alguma razão há quatro anos foi desencadeada a luta contra a corrupção –, não surpreenderia se o montante pago pelo equipamento pudesse cobir, também, ferramentas importantes como as que citamos, assim como chuveiros para duches pós-mergulho na água do mar, algo corriqueiro noutras paragens!
Dada a sua reduzida dimensão – oficialmente a extensão é de 1,5 km –, o espaço passou naturalmente para a alçada da administração do distrito urbano de Benfica. É óbvio que, provavelmente, haja outras prioridades para a municipalidade, mas em se tratando do principal ex-libris da circunscrição e potencial fonte de geração de receitas por via de impostos e outras contribuições, era necessário que se lhe prestasse maior atenção.
Mais: se em relação à instalação de relógios públicos a administração pode até alegar falta de recursos, o que mesmo assim é questionável, o mesmo constrangimento não se coloca quanto à marcação do piso, não só para assinalar as distâncias, mas também para demarcar a faixa de pedestres. Seriam necessários apenas uns poucos baldes de tinta e um aparelho de medição electrónica ou mecânica, de que, certamente, a Administração Municipal ou o Governo da Província dispõem. Neste caso particular, há fortes possibilidades de haver descaso da administração ou… incompetência. Também não se descarta a possibilidade de ser uma jogada que visa levar à deterioração do equipamento, a fim de beneficiar de uma reforma mais ampla, com o que também gera comissões bem mais vantajosas que uma pintura aqui ou uma soldadura acolá. Afinal, isto é Angola, país que há décadas frequenta os lugares cimeiros dos diferentes rankings de corrupção divulgados pelo Mundo.
De um lado parcialmente bordejado por palmeiras e totalmente de casas, ao passo que do outro beijaa praia que margeia o mar, o Calçadão enferma de sérios problemas de manutenção, passados apenas cinco anos desde que foi entregue ao Ministério das Obras Públicas, a dona da obra. A vedação da quadra de andebol e futsal está a cair aos pedaços, alguns aros de tabelas de basquetebol estão entortados e desprovidos de cestas e boa parte dos aparelhos fixos de musculação está danificada.
O cenário de desleixo é completado pelo aspecto desaprimorado e ressequido da maior parte dos jardins – alguns, entretanto, são tratados por moradores – a que se junta uma praia pejada de resíduos de toda a sorte. Sacos e garrafas de plástico, latas e garrafas de bebidas, calçado, peças de roupa descartadas, troncos de árvores e até entulhos de obras “ornamentam” a faixa de areia. Mesmo em tempo de Pandemia, durante o qual as medidas de segurança sanitária proíbem os banhos de mar, a praia resiste imunda em consideráveis trechos da sua extensão. O que quer dizer que quando a actividade balnear for desobstruída, o cenário poderá ser bem pior.
O único parque infantil público do espaço – o outro foi concedido à exploração – já não pode ser considerado como tal, porque o estado de degradação em que se encontra põe em risco a integridade física dos pequenos usuários. Além da deterioração, há sinais que indiciam actos de depredação, o que não deixa de ser estranho, visto haver no local um posto de Polícia. Curiosamente, raramente se vê um agente ou graduado da corporação sair da toca, onde se acoitam dia e noite. Quem passa pelo local dificilmente percebe a presença da Polícia, tão omissa que tem sido nas suas obrigações.