Sempre que pretende enquadrar os factos nos seus devidos contextos, Nelson Herbert, um jornalista guineense que trabalha para a Voz da América, costuma dizer: vamos e venhamos.
Com a devida vénia, vamos hoje lançar mão à ferramenta do nosso confrade.
Então,
Vamos:
1
No dia 18 de Maio, a Televisão Pública de Angola e a TV Zimbo tiraram do anonimato um até aí zé ninguém.
Desconhecido da generalidade dos militantes da UNITA, Rui Galhardo Silva saltou para o estrelado porque nesse dia denunciou Adalberto Costa Júnior como autor moral de um pretenso linchamento a que escapara no Uíge, graças à providencial presença de um responsável policial.
Na sequência de uma conferência de imprensa, estranhamente concorrida, porque todos os jornalistas presentes nunca tinham ouvido falar dele, Rui Galhardo saltou para as manchetes da comunicação social pública porque, entre outros adjectivos, qualificou o líder da Unita como “mentiroso compulsivo”.
Por “unanimidade”, a comunicação social pública tomou a ruptura de Galhardo com ACJ como uma grande “baixa para a UNITA”. Naquele dia e nos dias seguintes, TPA e Zimbo “venderam” ao país a “certeza” de que o azedume do zé ninguém Rui Galhardo era o começo da derrocada total da UNITA.
Porém, quer naquele como nos dias subsequentes, tanto a TPA quanto a TV Zimbo foram capazes de identificar o vazio que a saída de Galhardo provocou na superstrutura da UNITA. Embora o apresentassem como “alto dirigente”, as duas estações não foram capazes de identificar o lugar que Galhardo teria desocupado na Comissão Política ou Permanente da UNITA.
A encenação, já de si péssima, ultrapassou os limites do ridículo quando, dias depois, disse que iria ao SIC apresentar queixa contra Adalberto Costa Júnior por pretensa tentativa de linchamento. Um batalhão de jornalistas, maioritariamente ao serviço ao serviço da comunicação social pública, acompanhou o denunciante até às portas da direcção-geral do Serviço de Investigação Criminal. A caminho do SIC e ante a demanda de sequiosos jornalistas, Galhardo foi atribuindo novas “qualidades e virtudes” a Adalberto Costa Júnior, a mais sonante das quais é a de que o líder da UNITA seria um “compulsivo” pedófilo e inigualável adúltero.
Depois dessa queixa ao SIC e das machetes que dela fizeram os órgão de comunicação social públicos, Rui Galhardo Silva desapareceu do radar e voltou para a sua condição natural de zé ninguém na UNITA. Hoje, já nem se sabe se o processo que intentou morreu ou está vivo.
2
Poucos dias depois, outra “explosão” de alegria nas redacções da comunicação social público. A demissão do secretário para a Mobilização Urbana da UNITA é anunciada como o golpe de misericórdia. A partir daquele momento, ganhou estatuto de “gente” um até ali obscuro Kakwiki Sampaio da Costa. Como o outro, Rui Galhardo, também o novo desertor apresenta-se à comunicação social com uma exigência inegociável: o afastamento de Adalberto Costa Júnior da presidência da UNITA.
Kakwiki Sampaio, cuja saída da UNITA foi ostensivamente festejada, é um velho viandante: esteve no MPLA, mas ninguém deu pela saída dele. Peregrinou pelo PRS, CASA-CE, UNITA e, finalmente, regressou à velha casa.
A própria comunicação social começou a ganhar consciência da comédia em que lhe tinham empurrado quando foi obrigada a classificar como grande baixa para a UNITA a deserção de um moto-taxista de Cacuaco.
O “regime” descuidou-se quando colocou à disposição de um moto-taxista num hotel para que ele, perante jornalistas incrédulos, trocasse reiteradamente mansão com maçã. Foi a partir dali que ficou definitivamente claro que o MPLA já estava a disparar apenas balas de festim.
Não tendo causado qualquer dano ao “inimigo”, a comunicação social pública foi ordenada para arquivar Kakwikis e outros desertores.

3
E venhamos:
No dia 28 de Julho, a comunicação pública surpreendeu o país com uma atitude incomum: silenciou em absoluto a entrevista de David Mendes à Rádio Despertar.
Nessa entrevista, a coqueluche da Zimbo, que é também deputado pela UNITA, fez revelações que fariam a festa a quem leva o jornalismo a sério.
Segundo uma sua admiradora, nessa entrevista David Mendes teria dito que:
a) Está fora de hipótese a criação de um projecto político autónomo;
b) O seu ingresso na CASA-CE depende de uma condição inegociável: a colocação do seu nome numa posição elegível na lista de deputados da Coligação ao futuro Parlamento;
c) As negociações com a Aliança Patriótica Nacional, do figurante Quintino Moreira, ainda não levaram a porto algum… Mas prosseguem.
d) O compromisso com a UNITA só será renovado se o Tribunal Constitucional, cujos calcanhares morde semanalmente na Revista da Zimbo, afastar Adalberto da Costa Júnior da presidência da UNITA. Ora, como o TC enfrenta barreiras difíceis para satisfazer os desígnios de David Mendes, a condição que faz para continuar na UNITA equivale à uma renúncia.
e) Embora (ainda) não tenha sido contactado, admite o ingresso no MPLA. Mas coloca uma condicionantezita: só entra no MPLA se o Presidente João Lourenço lhe garantir pessoalmente que continuará a dar combate à corrupção depois de 2022.
Combinadas, as duas condições que coloca à UNITA e a João Lourenço tornam praticamente consumados a deserção de David Mendes da UNITA e o seu subsequente ingresso no MPLA.
O que é estranho é que decorridos 20 dias, TPA, Zimbo e parentes próximos e afastados ainda não tenham dado eco à deserção de David Mendes da UNITA, essa sim, uma baixa com algum simbolismo, porque é um deputado.
Jurista de formação e com escritório de advogado próprio, o mesmo, que defende o desertor Rui Gualhardo, David Mendes até podia constituir-se em vítima de discriminação…
“Analista” residente da Revista Zimbo, a David Mendes nunca foi perguntado se consegue analisar com equidistância fenómenos relativos à UNITA, Frente Patriótica e outras forças que fazem verdadeira oposição ao MPLA, estando ele de volta ao partido governante.
Não conseguindo disfarçar a excitação que David Mendes lhe provoca sempre que se refere, com visível desprezo, a ACJ, a “moderadora” Leda Macuéria tem consciência dos danos que provoca à imagem dos jornalistas angolanos?
