Nomeada no dia 19 de Agosto para a presidência do Tribunal Constitucional, a advogada Laurinda Cardoso encontrou entre vários processos que tramitam na casa um em que pretensos militantes da UNITA pleiteiam a destituição do líder da organização.
Realizado em Outubro de 2019, o XIII congresso da UNITA elegeu Adalberto Costa Júnior para presidente do partido.
Através do Despacho 3/20, de 19 de Junho, o Tribunal Constitucional homologou os resultados desse congresso, depois de haver constatado a “conformidade da convocatória, do quórum e demais requisitos legais e estatutários”, imprescindíveis à realização do evento.
Em Maio deste ano, quase dois anos depois do congresso, pretensos militantes da UNITA demandaram o Tribunal Constitucional para impugnar a eleição de Adalberto Costa Júnior sob a alegação de que à data do facto ele possuiria nacionalidade portuguesa.
Com a mão visível do MPLA, a imprensa pública angolana e redes sociais afins iniciaram, desde então, uma “ruidosa” campanha de diabolização do presidente da UNITA, não obstante o seu partido haver provado, documentalmente, que a nacionalidade lusa de Adalberto Costa Júnior cessou antes da realização do XIII congresso da organização.
No dia 07 de Agosto, reagindo à constituição da Frente Patriótica Unida, o Secretariado do Bureau Político do MPLA disse, em comunicado, que a liderança de Adalberto Costa Júnior da UNITA estava “por um fio”.
A inopinada alusão ao caso do líder da foi interpretada como uma pressão do MPLA sobre o Tribunal Constitucional.
No dia 27 de Agosto, o secretário do Bureau Político do MPLA para os Assuntos Políticos e Eleitorais foi publicamente confrontado com o interesse do seu partido no caso que tramita no Tribunal Constitucional. À pergunta sobre a razão por que o “MPLA perde tempo em pressionar o Tribunal Constitucional para destituir o líder da UNITA, em vez de se apegar num programa que possa repercutir-se na vida do cidadão”, visivelmente constrangido, Mário Pinto de Andrade respondeu: “Vocês ouviram o Tribunal a pronunciar-se sobre a destituição do líder da UNITA? Quer o nosso Partido, quer o Tribunal Constitucional não têm legitimidade de destituírem o ACJ, nesta altura, até porque o pacote do XIII congresso da UNITA, já foi promulgado em Diário da República. Quando se promulga, significa dizer que o tribunal reconheceu o Estatuto, o Presidente eleito, os membros da Comissão Política concomitantemente, os membros do Comitê Permanente. Se alguém quisesse impugnar, tinha de ser antes do Tribunal se pronunciar, já estamos a caminho de 2 anos, não é necessário ser especialista de Direito para perceber isso. Tudo que vocês ouvem por ali não passa de jogos psicológicos das Redes Sociais, que é normal nesta fase”.
Pressionado pela audiência, Mário Pinto de Andrade alongou-se um pouco mais nas explicações, revelando que, com o famigerado comunicado, o MPLA tentou, apenas, “abalar a estrutura da UNITA, uma vez que é o nosso maior rival, também é normal em Política”.
Mário Pinto de Andrade resumiu a posição pública do seu partido sobre um caso que tramita no Tribunal Constitucional a meros “jogos psicológicos” destinados a “abalar a estrutura da UNITA”.
No dia 23 de Agosto, quando recebeu as pastas do seu antecessor, a nova titular do órgão deixou claro que o “Tribunal Constitucional deve posicionar-se acima das querelas político-partidárias, não estar ao serviço de interesses específicos de partidos políticos, sejam maioritários ou minoritários, e deve evitar qualquer intervenção abusiva na vida interna dos partidos políticos e de organizações afins. Sempre que for chamado para resolver um problema da esfera específica de uma organização político-partidária, o Tribunal Constitucional fá-lo-á no estrito cumprimento da Constituição e da Lei”.
Não obstante o compromisso de Laurinda Cardoso de não envolver o Tribunal Constitucional em questiúnculas internas de partidos políticos e, ainda, de Mário Pinto de Andrade reconhecer que o MPLA não tem legitimidade de destituir o líder da UNITA, as facções digitais do partido governante já cantam vitória nas redes sociais.
A nomeação de uma cidadã com dupla nacionalidade para a presidência do Tribunal Constitucional coloca o Estado angolano perante delicados constrangimentos de ordem política e ética. Nos termos da nossa legislação, Laurinda Cardoso não pode candidatar-se a Presidente da República. Mas será ela – se até lá for mantida no cargo – que dará posse ao futuro Presidente da República!
A acção intentada por pretensos militantes da UNITA, alguns dos quais já assumiram publicamente a mudança de camisola, assenta na suposta nacionalidade portuguesa que Adalberto Costa Júnior deteria à data em que a sua candidatura à liderança da UNITA foi validada pela Comissão Organizadora do XIII congresso.
Questões de dupla nacionalidade devem provocar algum desconforto à nova presidente do Tribunal Constitucional.
O portal Club-K acaba de publicar um documento, emitido pela Conservatória dos Registos Centrais de Lisboa, atestando que Laurinda Cardoso (o sobrenome é do marido) também tem nacionalidade portuguesa.
Nascida no Porto Amboim, Kwanza Sul, a 17 de Junho de 1975, Laurinda Cardoso adquiriu a nacionalidade portuguesa nos termos do art.º 3.º, n º 1, da Lei nº 37/81, de 03 de Outubro.
Não se sabe se à data em que a nomeou, o Presidente da República sabia ou não da dupla nacionalidade da nova presidente do Tribunal Constitucional.
No ordenamento jurídico angolano, só é impeditiva para o exercício do cargo de Presidente da República uma segunda nacionalidade adquirida.
Porém, a nomeação de uma cidadã com dupla nacionalidade para a presidência do Tribunal Constitucional coloca o Estado angolano perante delicados constrangimentos de ordem política e ética.
Nos termos da nossa legislação, Laurinda Cardoso não pode candidatar-se a Presidente da República. Mas será ela – se até lá for mantida no cargo – que dará posse ao futuro Presidente da República!
Por outro lado, em qual das vestes (angolana ou portuguesa) Laurinda Cardoso se encontrará quando – e muito possivelmente isso acontecerá várias vezes – for a Portugal em missão de serviço?
Diga-se o que se disser, o anterior Presidente da República jamais nomearia um presidente do Tribunal Constitucional sem antes seguir-lhe o rasto. É também para isso que servem os Serviços de Inteligência. E não apenas para fomentar intrigas e catalogar cidadãos com base nas suas ligações ou preferências partidárias.
Urge que as decisões do Presidente da República sejam precedidas de um aturado e rigoroso “casting”.
Por outro lado, e mesmo não havendo dúvidas de que o Presidente João Lourenço tem apenas a nacionalidade angolana, à velocidade com que se descobre que membros da direcção do MPLA têm nacionalidade portuguesa, não seria mau que, tal como a UNITA o faz, o MPLA também exija que apenas os que tenham nacionalidade angolana e mais nenhuma possam ocupar determinados cargos.
A nacionalidade portuguesa da presidente do Tribunal Constitucional destapou o que muitos diziam em surdina: a equipa de João Lourenço – SIE, SINSE, GAPI, Casa Militar, SBP do MPLA , etc., etc. não faz “due diligence”.
Foi assim com Carlos Panzo, efémero secretário do Presidente para os Assuntos Económicos, foi assim com Vítor Fernandes, ministro da Indústria e Comércio e é agora assim com Laurinda Cardoso.
Das muitas ilações que a revelação do Club-K permite, uma delas é de que o discurso anti-Adalberto, por causa da sua antiga nacionalidade portuguesa, ficou agora órfão de pai e mãe.
O que coloca o exército digital do MPLA naquilo que os brasileiros chamariam saia justa…