Nos termos da Lei do Processo, não há nenhuma prazo para o Tribunal Constitucional aclarar as dúvidas que o Acórdão 700/21 suscitou ao presidente da UNITA.
No final da semana passada, Isaías Samakuva dirigiu carta à presidente do Tribunal Constitucional, Laurinda Cardoso, solicitando-lhe esclarecimentos sobre:
1.”Ao declarar sem efeito o XIII Congresso ordinário de 2019 e ulteriores actos praticados na eleição e nomeação dos órgãos singulares e colegiais, os actos ulteriores ora sem efeito limitam-se aos actos praticados na eleição e nomeação dos órgãos singulares e colegiais, ou incluem também contratos, acordos e outros actos administrativos de gestão corrente?”
2. “Ao ordenar que a UNITA deve ‘manter a ordem de composição, competência, organização e funcionamento saída da direcção central eleita no XII Congresso ordinário de 2015’, e sabendo que o mandato dessa Direcção, nos termos dos estatutos, é de quatro anos, qual é a natureza do mandato ora outorgado à direcção central eleita no XII Congresso?”
3. “Tem a direcção eleita em 2015, e com mandato democrático expirado, plena legitimidade para exercer todas as competências que os Estatutos e a lei conferem aos órgãos de direcção dos partidos políticos no Estado de direito democrático?”
4. “Qual é a duração do mandato outorgado pelo Acórdão n.º 700/2021 à direcção central eleita no XII Congresso ordinário, em 2015?”
Fonte do Tribunal Constitucional contactada pelo Correio Angolense disse ser impossível determinar o prazo em que o presidente da UNITA verá atendidas as suas dúvidas.
Segundo essa fonte, processos da natureza do desencadeado por Isaías Samakuva “consomem, em média, seis meses”. O processo é analisado individualmente por cada um dos 11 integrantes da corte e só depois é decidido pelo plenário do Tribunal Constitucional. “Mas não há nenhum tempo limite estabelecido”.
O pedido de esclarecimentos de Samakuva suscitou apreensões sobre o XIII congresso da UNITA.
No dia 20, a Comissão Política da UNITA decidiu realizar o XIII congresso do partido até ao próximo dia 4 de Dezembro.
No comunicado produzido no final dessa mesma reunião, a Comissão Política disse ter interpretado e aceite o Acórdão 700/21, do Tribunal Constitucional, que anulou o XIII congresso da UNITA realizado em 2019.
Foi com um misto de surpresa e incredulidade que a opinião pública soube no final de semana que o presidente da UNITA acionou o Tribunal Constitucional para dissipar dúvidas que o Acórdão lhe suscitou.
Segunda-feira, o próprio Isaías Samakuva confirmou à imprensa ter pedido esclarecimentos ao Tribunal Constitucional sobre “alguns aspectos do Acórdão difíceis de entender”.
Nenhum jornalista presente perguntou a Samakuva sobre se partilhou as suas dúvidas com os restantes membros da Comissão Política na reunião do dia 20.
Constitucionalistas ouvidos pelo Correio Angolense estão divididos sobre as consequências da diligência de Samakuva junto do Constitucional.
“Se o Tribunal Constitucional entender essa diligência como recurso, a consequência imediata é que Adalberto Costa Júnior ainda é presidente da UNITA. Mas se não a entender como recurso, significa que Isaías Samakuva é o presidente”. Seja como for, diz essa fonte, o pedido de esclarecimentos “não paralisa a UNITA. Ela pode continuar as suas actividades, inclusive os preparativos para o congresso”.
Outro constitucionalista, que também falou ao Correio Angolense na condição de não ser identificado, diz que se aceite e aprovado pelo Tribunal Constitucional, o pedido de aclaração feito por Samakuva fará “parte complementar da decisão”. Mas alerta que dessa diligência pode resultar a redefinição do alcance do que já foi decidido pelo Tribunal Constitucional. “Não sei se a UNITA tomou uma boa decisão. É que os efeitos positivos obtidos na primeira decisão podem ser anulados”.
Afirmando não perceber as motivações do líder da UNITA “e nem de quem o aconselhou a ir ao Tribunal Constitucional”, esse jurista sugere que a diligência de Samakuva sugere alguma dissintonia com o clima de mobilização interna a favor de Adalberto Costa Júnior. “No extremo, o Constitucional pode ir até ao impedimento de Adalberto de concorrer à eleição para presidente da UNITA”.
Sobre o órgão do Tribunal Constitucional que esclarecerá as dúvidas evocadas pela UNITA, a fonte do Correio Angolense não tem a menor dúvida: “Tem de ser o Plenário. Vai sair um novo acórdão e esse pode ser mais violento que o anterior, ou totalmente benevolente, caso o Tribunal queira reparar os erros cometidos do Acórdão 700/2021”.
Nas declarações que prestou à comunicação social, Isaías Samakuva não só não estabelece nenhum vínculo entre o pedido de aclaração que fez ao Constitucional e os preparativos do XIII congresso da UNITA como toma como possível a realização do evento no horizonte temporal estabelecido pela Comissão Política.
“Normalmente, nós preparamos o congresso em quatro meses. Mas tendo em consideração que determinadas tarefas, que normalmente levam tempo já foram feitas durante o peito anterior, achamos que podemos procurar trabalhar afincadamente e fazer o congresso nesse período de tempo, ou seja, dentro de pouco mais ou menos 40 dias”.
No domingo, David Mendes disse na Revista Zimbo ser muito difícil que a UNITA realize o seu congresso em Dezembro. E justificou: “Para que haja um congresso é preciso que hajam conferências municipais, as provinciais, a eleição dos delegados, a discussão dos documentos reitores do congresso. Surpreende-me ainda esse compromisso da UNITA em fazer o congresso em 30 dias quando há bem pouco tempo a UNITA veio a público dizer que não tinha dinheiro (…)”
David Mendes tem o “dom” de antecipar-se às decisões judiciais, mormente as do Tribunal Constitucional.