O fim da linha para Ricardo D’Abreu

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Uma das estrelas mais cintilantes no Governo de João Lourenço, o ministro dos Transportes está muito próximo de uma estrepitosa queda.

Nesses quatro anos, João Lourenço fez de Ricardo de Abreu presidente do Conselho de Administração e da Comissão Executiva do Banco de Poupança e Crédito, secretário do Presidente da República para os Assuntos  Económicos e Ministro dos Transportes. 

Menino bonito do Presidente da República, “Manhã de Domingo”, como também é conhecido o ministro dos Transportes, negociou parcerias com a Turkish Airlines, tem quase tudo acertado para a montagem do Metro de Superfície em Luanda, sem dúvida uma boa solução para o caótico problema do transporte público na capital do país e tem carta branca para outras iniciativas. No Executivo do Presidente João Lourenço ele é, inquestionavelmente, uma das peças  de maior “valor facial”.   

Com carta branca para tudo, Ricardo Viegas D’Abreu olhou para o céu e nem aí encontrou limites.

Inebriado, o jovem ministro convenceu-se que o excessivo protagonismo que o Presidente da República lhe proporciona inclui a trapaça, o roubo, o peculato ou nepotismo.

Com a evidente conivência de alguém do staff presidencial, no dia 23 de Agosto, “Manhã de Domingo” levou a que o Presidente da República assinasse o Decreto n. 197/16, com o seguinte teor:

“1. É autorizada a despesa no valor total equivalente em Kwanzas a USD 114 000 000, 00 (cento e catorze milhões de dólares) para aquisição de 2 (dois) imóveis infra-estruturados, sitos no Distrito Urbano da Ingombota (…), Edifício Welwitschia Business Center (…) com área total de 10 640 m2 (…) e Edifício Chicala (…) com área total de 6 369 m2 (…), respectivamente, para a acomodação, apetrechamento e aquisição de meios de trabalho dos serviços públicos do Ministério dos Transportes e da Agência Reguladora de Certificação de Carga e Logística de Angola”.

Numa Luanda em que “todos se conhecem”, não tardou a saber-se quem foram os beneficiários directos da milionária operação: o ministro Ricardo Viegas D’Abreu e o seu amigo e compadre Ruca Van-Dúnem.

Em sintonia com a reprovação popular, Rafael Marques de Morais fez o “mapa” da operação e entregou à Procuradoria Geral da República uma denúncia, abundantemente fundamentada, que, no mínimo, tem de culminar com a anulação da operação autorizada pelo Presidente da República e a responsabilização política dos “artistas” directamente envolvidos.

Porque considera que o “negócio de compra e venda dos edifícios Welwitschia Business Center e Chicala, em Luanda, é uma grande nebulosa, envolvendo o ministro dos Transportes e um seu amigo de longa data”, no dia 8 deste mês Rafael Marques entregou à Procuradoria-Geral da República um “pedido de investigação cabal dos contornos potencialmente ilegais de toda a operação”.

Sob o título O Ministro dos Transportes e o Edifício do amigo, fundamenta a solicitação de uma investigação criminal em elementos tais como:

  • Inadequabilidade do edifício WBC para a função que deveria desempenhar, uma vez que parte do mesmo se destina a habitação;
  • Aparente valor empolado e excessivo da compra e venda;
  • Amizade e relações de compadrio entre o Ministro e o vendedor.

No pedido de investigação feito à PGR, Rafael Marques diz que o Welwitschia Business Center, propriedade da Transporte de Carga a Granel, Lda. (TCG), tem como co-proprietário e director-geral Rui Óscar Ferreira Santos Van-Dúnem, amigo próximo e de infância do actual Ministro dos Transportes, Ricardo Daniel Sandão Queirós Viegas D’Abreu. Rafael Marques revela, também, que o referido imóvel, cuja construção se iniciou em 2011 e que teve um custo inferior a 30 milhões de dólares,  permaneceu durante vários anos à venda, sem sucesso, por 45 milhões de dólares.

Depois da denúncia à PGR, ao denunciante chegaram informações fidedignas de que o proprietário do WBC chegou a baixar o preço do imóvel para 22 milhões de dólares e nem assim encontrou interessados.

Com a “mãozinha” do amigo e compadre Ricardo Viegas D’Abreu e de mais algum compincha na Presidência da República, Rui Óscar Ferreira Santos Van-Dúnem, filho do falecido nacionalista Beto Van-Dúnem, vendeu ao Estado, por escandalosos 91 milhões de dólares, um edifício que o mercado rejeitou por 22 milhões.

Além da dinheirama já gasta, os cofres públicos vão ser pressionados a novos esforços para as obras de adaptação do edifício ao fim para que foi comprado.

O Welwitschia Business Center tem 11 andares, sendo os dois últimos ocupados por dois apartamentos de luxo. As obras de adaptação do edifício impõem-se porque, como diz Rafael Marques, “um Ministério não serve para ser habitado pelos seus funcionários. Espera-se que estes lá trabalhem, mas não que lá durmam”.

Contactado pelo Correio Angolense, uma fonte do Ministério das Finanças disse que a ministra Vera Daves fez tudo ao seu alcance para inviabilizar a operação. “Ela fez tudo para alertar o Presidente para a asneira em que estávamos a incorrer, mas há forças que lhe impediram o acesso ao Presidente da República”.

Com as suas repetidas autorizações para despesas não contempladas no Orçamento Geral do Estado, o Titular do Poder Executivo tem forçado a sua auxiliar para a área das Finanças a verdadeiros golpes de rins. 

Há dois dias, num breakfast com jornalistas seniores e fazedores de opinião, Vera Daves disse que “não há dinheiro  para regalias”. 

Sobre os pedidos de residência para todos os magistrados, bem como aquisição de viaturas e viagens, ela enfatizou: “não temos vindo a ceder, não temos dinheiro para dar e não damos“.

Na Procuradoria Geral da República a convicção é de que o ministro dos Transportes foi muito para além do risco vermelho.

Os factos em presença são demasiado graves para serem menosprezados. Por maior que seja a simpatia que o Presidente tenha pelo ministro, esse caso não permite condescendência. Se dependesse exclusivamente de mim, eu lhe garantiria que esse é o fim da caminhada do ministro Ricardo”, disse, convicta, a fonte do Correio Angolense.

A negociata promovida por Ricardo D’Abreu é considerada, a vários níveis, como uma traiçoeira rasteira ao Presidente João Lourenço, a quem deve, totalmente, a meteórica ascensão no aparelho de Estado.

“Trata-se, obviamente, de uma punhalada nas costas do Presidente da República”, segundo sintetizou ao Correio Angolense um membro do Governo.

Dado a ostentações e exibicionismos, este ano o ministro dos Transportes deixou colegas e outras entidades boquiabertas quando, para uma rotineira deslocação de serviço ao Lobito, mobilizou uma impressionante frota de carros, maioritariamente jeeps de alta cilindrada, acabados de sair de concessionários.

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