TRATADO ABAIXO DE CÃO

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Consagrado na Constituição da República de Angola, o Estatuto dos Antigos Presidentes da República, definido no artigo 133 .º, estabelece:

1.    “Os antigos Presidentes da República gozam das imunidades previstas na Constituição para os membros do Conselho da República.

2.    No interesse nacional de dignificação da função presidencial, os antigos Presidentes da República têm os seguintes direitos:

a)    Residência oficial;

b)    Escolta pessoal;

c)    Viatura protocolar;

d)    Pessoal de apoio administrativo

e)    Outros previstos por lei.

3.    O estatuto previsto no presente artigo não é aplicável aos antigos Presidentes da República que tenham sido destituídos do cargo por responsabilidade criminal, nos termos da presente Constituição.”

Na sua edição deste fim de semana, o semanário Novo Jornal publica uma matéria em que responsáveis da Empresa Nacional de Distribuição Eléctrica (ENDE) gabam-se de haverem ido ao bairro Miramar para notificar José Eduardo dos Santos por atrasos no pagamento do consumo de energia eléctrica.

Completamente ostracizado na abertura do VIII congresso do MPLA, quinta-feira, a ida – e consequente publicitação – de funcionários da ENDE à residência do antigo Presidente da República para notifica-lo de atrasos no pagamento de consumos de energia eléctrica conforma uma verdadeira e indisfarçável vendeta a José Eduardo dos Santos.

É do mais elementar bom senso que a residência oficial, que a Constituição de Angola atribui aos antigos Presidentes da República, inclui consumos como de energia eléctrica, água e outros.

Por outro lado, e tendo direito a “pessoal de apoio administrativo”, não é expectável que seja o antigo Presidente da República a deslocar-se aos balcões da ENDE para pagar o consumo de energia eléctrica da casa oficial que o Estado lhe destinou.

A publicitação da diligência da ENDE junto da residência do antigo Presidente da República não tem outro objectivo que não a humilhação e ridicularização do seu ocupante oficial.

Qualquer empresa pública, nomeadamente as de Comunicação Social,  acumulou dívidas colossais junto da ENDE e da EPAL. Todas, ou quase, as empresas de Comunicação Social públicas estão em dívida com o Instituto Nacional de Segurança Social.

Há poucos anos, o BPC, um banco público, ameaçou levar a tribunal funcionários que deixassem escapar, para conhecimento geral, uma pretensa lista com os nomes dos maiores devedores da instituição. 

Na altura, sustentou-se que a ameaça do BPC, então dirigido por Ricardo D’Abreu, visava proteger a honra e o bom nome dos devedores.

Ao publicitar a diligência feita junto da sua residência, a ENDE mostra que José Eduardo dos Santos não é merecedor de honra e nem de bom nome. 

A ENDE é tutelada pelo Ministério da Energia e Águas, cujo titular, João Baptista Borges, o antigo Presidente da República manteve no cargo, apesar de avassaladoras evidências do seu comprometimento com casos de corrupção.

Àqueles que hoje se “deliciam” com a humilhação de José Eduardo dos Santos convirá lembrar um velho provérbio português segundo o qual “quem com ferro mata, com ferro morre”.

Pode mesmo dizer-se que alguns sectores do MPLA  reservam a José Eduardo dos Santos tratamento menos digno do que é destinado a cão tomado pela combinação de sarna com raiva.

Há pouco menos de 5 anos, muitos dos actuais carrascos do antigo Presidente da República se diziam seus indefectíveis – na felicidade ou na tristeza.