Congresso da Nação: discursos, boicotes e direitos desiguais

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Repetidas vezes, no discurso oficial, aparece o apelo: “precisamos de todos” para construir o país. 

A opinião pública em geral concorda. Incluindo aí a opinião pública conexa ao partido no poder: que, aliás, não se cansa de bater no ferro quente da reconciliação nacional. 

Quando chega a hora da prova dos 9, ai Jesus que já é demais: “país é todo nosso, para os outros, nada.”

Curiosamente, quem discursou nesse sentido (isto durante o recém terminado Congresso da Nação) foi o líder da coligação CASA-CE, o economista Manuel Fernandes, sobre o qual se levantam suspeitas de estar conectado com o regime em vigor. 

Partiu dele a crítica mais acintosa: que ficou registada e resumida na parte do discurso que fez na sessão de abertura em que se queixou do MPLA. 

Disse (aplaudido) que “eles pensam que só eles é que são os donos do país.” A citação é de memória, o que pede aos eleitores que façam uma leitura aproximada. 

Do discurso de Francisco Viana, no entanto, não haverá (porventura) muito por clarificar, porque foi com clareza que, primeiro, lamentou a “ausência” de cobertura do evento por parte da televisão (que se presume…) pública, mas que tem dono. 

A ausência da TPA poderia (talvez) ser atribuída a meios técnicos insuficientes de cobertura jornalística, pelos menos avisados. 

Não é o caso de Francisco Viana. 

No seu discurso de abertura, foi além do que era esperado, ao identificar a entidade por detrás da conduta da televisão pública: João Lourenço. 

Avisado, o filho de um dos mais notáveis combatentes na história da luta de libertação nacional, Gentil Viana, tratou de contornar o boicote do “senhor ordens superiores” e o congresso foi transmitido para os EUA e Europa, por conexões alternativas.

Dentre os discursos há que (justamente) destacar o de Dom Zacarias Kamwenho, cuja capacidade oratória, aos 87 anos, é tida como notável. 

Temos (ainda) uma nação por construir“, concluiu o único angolano a conquistar o Prémio Sakarov.

O reverendo Ntoni a Nzinga, por sua vez, reiterou que “o poder reside na soberania do povo“, aliás como é preceituado na Constituição da República.

Fazer o reset do país. Sentarmos e conversarmos. E depois retomarmos a caminhada“, disse.

Construir a nação com base na verdade“, defendeu o líder do projecto político “PRQ-JA”, Abel Chivukuvuku.

Finalmente, não pela ordem dos discursos, Adalberto Costa Jr, depois de uma reflexão da realidade política e social, denunciou o estado das coisas: “consolida-se o estado partidário e não o estado democrático de direito. Para além do poder, não há mais vida? Para além de eleições, não há mais vida?

(*) Em próximo artigo, o discurso de Filomeno Vieira Lopes, líder do Bloco Democrático