Não há clima no TC

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O Tribunal de Contas está virtualmente paralisado.

Torturada pelas denúncias de má gestão, a presidente do tribunal, Exalgina Gamboa, está mal humorada e rabugenta. Vê em cada juiz conselheiro um potencial delator.

O baixo astral da presidente do Tribunal de Contas instalou o medo e a insegurança na casa. Esta semana, ela suspendeu intempestivamente uma reunião de trabalho apenas porque a vice-presidente, Domingas Alexandre, anunciou que chegaria atrasada não mais do que uns cinco minutos.

Exalgina Gamboa está azeda desde que é suspeita da prática de actos lesivos do interesse público.

Há pouco menos de 15 dias, a newsletter Africa Monitor Intelligence (AMI) implicou Exalgina Gamboa na transferência de dinheiro do Tribunal de Contas para uma conta privada do seu filho Haile Cruz, domiciliada num banco português. Essa conta teria sido irrigada com 2, 5 milhões de euros e mais 500 mil dólares. Interrogado pelas autoridades lusas sobre as origens do dinheiro, o filho teria denunciado a mãe.

A publicação assegura que as autoridades portuguesas comunicaram às suas homólogas angolanas a procedência do dinheiro depositado nas contas de Haile Cruz e os procedimentos que adoptaram, nomeadamente o bloqueio e o congelamento dos fundos.

Informada, a Procuradoria Geral da República não tomou qualquer diligência para o imediato repatriamento do dinheiro presumivelmente desviado das contas do Tribunal de Contas. A única e até agora conhecida diligência tomada pela PGR foi informar o gabinete do Presidente da República sobre os factos relatados pelas autoridades lusas.

No dia 16 de Junho, a PGR emitiu uma titubeante nota em que negava ter tomado conhecimento de qualquer irregularidade envolvendo a presidente do Tribunal de Contas.

Mas, estranhamente, não se comprometeu a investigar os factos denunciados pela Africa Monitor Intelligence.

No dia 20 de Junho, o Maka Angola, de Rafael Marques, destapou factos que implicam Exalgina Gamboa numa perturbadora farra com dinheiro público.

Em 2020, o Governo procedeu à aquisição de uma residência no exclusivo e luxuoso Condomínio Malunga, no Talatona, em Luanda, pela módica quantia de 3,5 milhões de dólares. O destinatário da propriedade era a veneranda Exalgina Gambôa. (…) O que fez a juíza Exalgina Gambôa com a casa oferecida pelo Estado angolano? Provas documentais na posse do Maka Angola demonstram que a juíza pagou 212,8 milhões de kwanzas à empresa Sholin Construções Lda., no dia 5 de Agosto de 2021. Este pagamento, com origem no Cofre Privativo do Tribunal de Contas, destinou-se à reabilitação da sua residência no Condomínio Malunga. Ao câmbio actual, trata-se de meio milhão de dólares para a reabilitação de uma residência de alto padrão de luxo, que lhe fora entregue nova, a estrear. O Condomínio Malunga tem 41 residências e a tipologia-padrão de cada vivenda de 450 metros quadrados é de quatro quartos (suítes), duas salas e cozinha equipada. Dispõe ainda de uma lavandaria com quarto de apoio, além de piscina, zona de churrasco e estacionamento para quatro viaturas. Uma vez que a “dignificação” da veneranda presidente Exalgina Gambôa requer as mobílias, acessórios e decorações mais caras do mundo, o Cofre Privativo do Tribunal de Contas pagou à empresa Annus Mirabilis Decoração, nos dias 26 de Março, 30 de Julho e 17 de Dezembro de 2021, o total de mil milhões e 426 milhões de kwanzas. O apetrechamento da residência no Malunga, ao câmbio actual, custou portanto 3,3 milhões de dólares. Aparentemente insatisfeita, Exalgina Gambôa também recorreu aos serviços da empresa J.A.V., de João Justino António, para a aquisição de mais mobiliário para uso particular. O Cofre Privativo de Justiça desembolsou para o efeito, a 30 de Julho de 2021, a quantia de 199 milhões de kwanzas. Ao câmbio actual, o valor ascende a 461 mil dólares. E assim chegamos a um apuramento de contas que nos diz que os gastos de Exalgina Gambôa com mobiliário foram superiores ao valor de aquisição da luxuosa vivenda de quatro suítes, diz o Maka Angola.

Na próxima segunda-feira completar-se-ão oito dias sobre a perturbadora denúncia sem que  o país tenha conhecimento de qualquer pronunciamento da Procuradoria Geral da República.

Apoiada em sólidas evidências, a denúncia de Rafael Marques não pode ser encarada com ligeireza.

Rafael Marques foi um dos principais rostos da luta contra a corrupção ao tempo do Presidente José Eduardo dos Santos. Essa causa valeu-lhe vários processos judiciais e até mesmo a prisão. Em Dezembro de 2018, o Presidente João Lourenço recebeu-o em audiência. Quase um ano depois, em Novembro de 2019, João Lourenço condecorou-o com uma medalha de mérito pelo seu combate contra a corrupção no país.  

O jornalista recebido e condecorado pelo Presidente João Lourenço pela sua abnegada entrega à luta contra a corrupção no tempo da outra senhora é o mesmo que expôs os factos que denunciam a face depredadora de Exalgina Gamboa.

Exalgina Gamboa entregou-se ao saque desenfreado porque encontrou no Tribunal de Contas uma situação institucional favorável.

A oferta de uma casa que custou ao erário 3, 5 milhões de dólares encorajou na presidente do Tribunal de Contas a tentação para a vida fácil. A compulsão para mobiliários caríssimos foi estimulada pelo acesso irrestrito aos cofres da casa.

A casa oferecida à Exalgina Gamboa justifica a pergunta: alguém chega a presidente de um Tribunal de Contas sem casa própria?

Antes de ser nomeada presidente do Tribunal de Contas, Exalgina Gamboa foi deputada e presidiu o Conselho de Administração da Assembleia Nacional.

Nos termos da Constituição da República, o “Tribunal de Contas é o órgão supremo de fiscalização da legalidade das finanças públicas”.

No retrato que  Rafael Marques dele faz, hoje o Tribunal de Contas tornou-se num mero mealheiro de Exalgina Gamboa.

Nomeada em 2018, Exalgina Gamboa ainda tem pela frente dois do seu mandato de 7 anos.  

Mas o país pode e tem de precipitar o fim do mandato de Exalgina Gamboa.

Aliás, a decência recomenda que a própria presidente do Tribunal de Contas desista do que lhe resta do mandato.

Em respeito ao Presidente da República, de quem deve a nomeação, ao Conselho Superior da Magistratura Judicial, aos próprios colegas do Tribunal de Contas, que hoje andam cabisbaixos, Exalgina Gamboa deve abrir mão do resto do mandato e devolver ao Cofre Privativo do Tribunal de Contas os milhões que esbanjou em mobiliário e remodelação da milionária casa que recebeu imerecidamente.