MPLA: Queda com “estrondo” em Luanda

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A estrondosa vitória da UNITA em Luanda, algo que acontece pela primeira vez na nossa história eleitoral de três décadas, está a ser creditada ao desempenho de Nelito Ekuiki, o responsável do partido na capital. Nas redes sociais e não só, o jovem político é visto como “Messias” e vitoriado pelo arrasador resultado (3-2) conseguido na mais importante circunscrição eleitoral do país, que por si só congrega cerca de um terço do número global de eleitores registados em Angola e na diáspora.

Pensamos que, embora a UNITA tenha feito o seu “trabalho de casa”, o que teve maior peso no desfecho do sufrágio em Luanda foi o grito de revolta de grande parte dos cidadãos. Em suma, foi o que em democracia se chama voto útil, aquele que independe da filiação ou simpatia partidárias, visando apenas mudança para melhor. Daí, a forma severa como o MPLA foi vergastado.

Se nos novos conglomerados habitacionais nascidos à volta da cidade de Luanda o voto na UNITA pode em parte explicar-se por razões étnicas – a esmagadora maioria é de origem Ovimbundu –, o mesmo já não se pode dizer em relação a redutos tradicionalmente do MPLA. Rangel, Sambizanga, Golfe e até Cazenga, o célebre “Congo Pequeno” dos primórdios da independência, onde os “camaradas” gozavam de simpatia quase irrestrita, também viraram as costas ao MPLA. Nessas “praças”, o grito de revolta foi fragoroso, quase ensurdecedor e ouvido com nitidez suficiente no “Kremlin”, a sede do “Maioritário”.

Mais do que votar na UNITA, muitos cidadãos votaram “contra” o MPLA. Um pouco como aconteceu com a UNITA nas primeiras eleições, em 1992, quando o líder do “Galo Negro”, Jonas Savimbi, falava alegremente nas bombas que colocou um pouco por todo o país e matou gente inocente, acenava aos naturais de Malanje com a hercúlea tarefa de empurrar o comboio com os dentes, assim como outras ameaças não menos assustadoras. Naquela ocasião, muitos votaram pela vida e não propriamente no MPLA, que acabou vencendo as eleições. Portanto, entendiam que corriam risco de vida com a UNITA no poder.

Com excepção do chamado voto fidelizado, que se estriba em grande parte no factor étnico, quem votou em Luanda (e noutras partes do país também) a favor da UNITA e “contra” o MPLA são cidadãos que (sobre)vivem em extrema pobreza, com menos de dois dólares por dia. Estes são a esmagadora maioria, representando 54% da população, segundo dados Segundo dados da organização World Poverty Clock (Relógio da Pobreza Mundial), que monitoriza o progresso contra a pobreza global e regional. 

Quem soltou o grito de revolta são angolanos que se condoeram com a morte da inofensiva vendedora ambulante Joana Kafrique, às mãos de um agente da polícia Nacional por cometer o “crime” de querer apenas dar algo que comer aos seus; quem deu o troco são milhares de “candongueiros” e camionistas molestados diariamente pela acção predatória da Polícia Nacional nas artérias dos centros urbanos e nas estradas nacionais; quem decidiu extirpar o “câncer” do descaso governativo foram médicos [colegas do Dr. Sílvio Dala, morto pela Polícia Nacional por não portar máscara facial], cujas reivindicações laborais caíram vezes sem conta em saco roto; quem votou foram as zungueiras, azucrinadas diariamente por fiscais que lhes prendem o negócio para depois distribuírem pelos respectivos haréns.  

Mas não foram apenas estes. Foram também empresários que viram muita “fruta” a ser colocada na carroça de um “Carrinho” que caiu do céu; foram jovens sem os empregos prometidos em 2017; foram cidadãos cujos familiares morreram em hospitais públicos por deficiente assistência médica, enquanto as elites demandam Portugal para se desfazerem de um simples calo; enfim, foi a população que acompanhou na media estrangeira escândalos como as negociatas do ministro João Baptista Borges ou da juíza Exalgina Gamboa, sem que o presidente da República mexesse um dedo.

Em nossa opinião, tudo isso, por junto e atacado, teve mais peso que qualquer campanha. O que aconteceu em Luanda foi a rábula do fruto maduro: cai sem necessidade de que alguém lhe jogue uma pedra ou lhe sacuda um cajado. Ou seja, cai naturalmente.