O “Partido” e o seu líder precisam, urgentemente, de estabelecer algumas regras de jogo para o competitivo campeonato da bajulação.
O ressurgimento do Movimento Nacional Espontâneo significa que o “campeonato da bajulação” está completamente desregrado e desregulado. Há aí pontapés e coices pelo meio.
A saída de José Eduardo dos Santos do poder, em 2017, fez supor o fim do Movimento Nacional Espontâneo, uma organização que Justino Fernandes, Job Capapinha, Fiel Didi e outros criaram com o expresso propósito de elevarem o então Presidente da República à condição de braço-direito de Cristo no mundo.
Depois da saída em cena do “artista”, o MNE hibernou, o que acalentou, nas mentes menos poluídas do país, a esperança do fim de um terrível pesadelo.
Porém, e animados pelo “vazio” deixado pelo MNE, um vazio que, afinal, era apenas temporário, marmanjos sequiosos de bem estar sem suar as estopinhas logo se reuniram no que chamaram Associação de Jovens Unidos & Solidários, uma similar dos “espontâneos”, que adoptou como patrono o Presidente João Lourenço.

Com o alto patrocínio do patrono, camiões da Casa Militar do Presidente da República foram postos à disposição de nova associação para percorrer o país oferecendo migalhas às populações mais afectadas pela fome.
Ao invés de enxadas, catanas, fertilizantes e outros meios necessários para que as vítimas produzissem os seus próprios alimentos e, dessa maneira, se libertassem da caridade, os jovens patrocinados pelo PR levaram-lhes sacos de arroz, óleo alimentar, sal e pouco mais. Ou seja, ofereceram peixe, ao invés de ensinarem as vítimas a pescar, como recomenda a milenar sabedoria chinesa.
Refeito da orfandade, e a coberto do fantástico desempenho da selecção nacional no campeonato mundial de futebol de amputados, em que obteve um honroso segundo lugar, o Movimento Nacional Espontâneo emergiu, tirou o corpo todo da água e com uma “surpreendente surpresa”: também adoptou o Presidente João Lourenço como alvo da sua adulação.
Não havendo nenhuma entidade reguladora no meio, o País vai assistir a uma luta sem quartel entre o reaparecido Movimento Nacional Espontâneo e os desocupados (alguns deles com cadastros sujos) agrupados no que chamam de Associação de Jovens Unidos & Solidários.
Em Janeiro, quando concedeu entrevista a representantes de cinco órgãos de comunicação social, cidadãos muito sensíveis ao sofrimento alheio, entre os quais se inclui este vosso escravo, quase desabaram em lágrimas perante a confissão do Presidente da República de que nada podia fazer para desencorajar a bajulação à sua pessoa.
“(…) eu sou, efectivamente, contra o culto à personalidade e à bajulação. Agora, não posso ser responsável pelo que os outros dizem e fazem. Eu não encorajo, mas se eles o fizerem não sei que medidas a gente vai tomar. Crime não é. Não sendo crime, bom, é mesmo só uma questão de educação, mudança de mentalidade. (…) Importante é que a semente está lançada, a de combate ao culto à personalidade e à bajulação. Portanto, vamos nos próximos tempos ver se as mentalidades mudam ou não. Espero bem que sim”.
Dez meses depois da entrevista, o ressurgimento do Movimento Nacional Espontâneo significa que a semente que o Presidente da República garanto ter lançado à terra secou completamente.
Bajulação, para que conste, é uma das práticas que prosperou no e com o eduardismo que João Lourenço prometeu combater sem tréguas na sua campanha eleitoral de 2017.
Sem qualquer entidade que os defenda, os angolanos decentes estão agora expostos a vergonhosas disputas pelas atenções e favores do Presidente da República.
Trata-se, no limite, de agressão à saúde mental dos angolanos.
E, para não variar, a comunicação pública alinha.
Se o “Partido” e o seu líder nada podem fazer para travar a “espontânea” geminação de Angola com a Coreia do Norte, ao menos que estabeleçam algumas regras, mínimas que sejam. Há que limitar e proibir mesmo algumas iniciativas “espontâneas”.
Se uma organização de bajuladores profissionais já é chatice que chegue, duas são um atentado à decência.