Guilhermina Prata, um caso exemplar

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Qualquer angolano razoavelmente sensato não confunde uma justa redistribuição da riqueza nacional com oferta de um Mercedes Bens ou de uma vivenda em condomínios de luxo a cada um de nós.

 No dia 26 de Setembro de 2017, no discurso que proferiu após ser investido, João Lourenço prometeu que ser “Presidente de todos angolanos”, que iria “trabalhar na melhoria das condições de vida e bem-estar de todo o nosso povo”.

Apesar de esperançoso, nenhum angolano interpretou o discurso de João Lourenço como um decreto que punha fim às desigualdades sociais.

O que a generalidade dos angolanos “viu” no discurso é o compromisso de um homem de “trabalhar na melhoria das condições de vida e bem-estar de todo o nosso povo”.

Trabalhar na melhoria das condições de vida de todos é indissociável de uma justa redistribuição do rendimento nacional.

E por justa redistribuição do rendimento nacional não se presume a distribuição de um carro top de gama ou de uma vivenda de luxo a cada um dos angolanos.

Redistribuição justa do rendimento nacional significa, essencialmente, proporcionar a todos os angolanos oportunidades para a sua própria realização.

Os angolanos, na sua generalidade, não reclamam casas comunitárias que lhes servir sopa.

Para a generalidade dos angolanos é, aliás, ultrajante engrossar as filas de sopa que administrações distritais e comunais promovem sob o ridículo pretexto de combater a pobreza.

Para um bom número de angolanos, também não é honroso o registo nas administrações para se habilitarem aos tostões que o Governo lhes atira ao chão por via do Programa Kwenda. 

Pessoa alguma sente orgulho da mendigar ou de viver à custa da caridade alheia.

Por uma justa redistribuição da riqueza nacional, os angolanos entendem oportunidades iguais, ou quase, para que todos e cada um possam viver do seu esforço.

Mas, para que se aproxime da meta de proporcionar melhores condições de vida a todos os angolanos, o Executivo e, especialmente, o Presidente João Lourenço tem de alterar o seu paradigma aritmético, em que 2 tem de passar a ser dividido por 2 e não por 1. Um pão dividido em duas metades, alimenta duas bocas. Um pão dividido em quatro metades alimenta 4 bocas. O mesmo pão alimentará uma única boca se não for repartido.

Quanto mais angolanos tiverem oportunidade, melhor será a redistribuição da riqueza.

Juíza jubilada do Tribunal Constitucional, mantendo intactos os salários e outros benefícios, a nomeação de Guilhermina Prata para o cargo de embaixadora de Angola em França é uma oportunidade negada a outro angolano. Ou seja, tendo ela rendimentos fixos garantidos, a sua nomeação retirou a outro angolano a oportunidade de ser embaixador ou embaixadora em Paris e, com isso, melhorar as suas condições de vida. É um caso típico de 2:1=2.  Isto é, da concentração dos benefícios nas mesmíssimas pessoas.

Nomeadas pelo Presidente, há individualidades que exercem, simultaneamente, funções remuneradas em várias entidades públicas e isso deixa muitos a lerpar. São coleccionadores de funções públicas, enquanto a maioria da população rói as unhas de desespero.

Acumular funções nas mesmas pessoas ou insistir na mera dança de cadeiras não atendem a velha máxima que recomenda a divisão da escassez pelas aldeias.

Ao restringir as suas escolhas a um núcleo muito pequeno de pessoas, o Presidente João Lourenço contraria o que prometeu naquele esperançoso discurso, nomeadamente “trabalhar na melhoria das condições de vida e bem-estar de todo o nosso povo”. 

As opções do Presidente da República favorecem um pequeno grupo de pessoas e assim não esbatem as graves assimetrias que vivemos no país. 

A adjudicação das principais empreitadas públicas a um mesmo e invariável grupo de empresas, a insistência nas mesmas pessoas para diferentes cargos públicos, mesmo quando no seu rasto não deixam obra alguma, sugerem que ser “Presidente de todos angolanos”, como prometeu naquele célebre discurso, não corresponde ao que, na verdade, lhe ia na alma. É algo que ele não queria ter dito. 

O caso da Guilhermina  Prata é paradigmático da obsessão do MPLA e do seu presidente de concentrarem as oportunidades do Estado nuns poucos cidadãos. O MPLA e o seu líder dividem os angolanos entre filhos e enteados.

A um número insignificante de angolanos entretêm com miseráveis “kwendas”, uma política assistencialista que não tira ninguém da pobreza, à maioria não dão cavaco, e concentram os privilégios num restrito grupo de cidadãos, de que Guilhermina Prata é um insultuoso exemplo. 

O Presidente da República tem de perceber que há milhões de angolanos que dispensam as esmolas do Estado. O que esses milhões pedem e esperam do seu país é de tratamento equitativo.

Apenas isso.