O Direito Romano, ramo em que se insere o nosso ordenamento jurídico, na sua génese, (451 Ac-Juliana Bezerra, professora de história) teve como fonte o Direito Costumeiro.
Revestiu-se da forma escrita (“Lex scripta”), com exposição pública em Roma da Lei das doze Tábuas (“Lex duodecim tabularum” ou simplesmente “duodecim tabulae”). Não é propriamente esta conversa que me traz em forma de reflexão até aos leitores.
É a propósito da condenação do Rei do Bailundo. Um ditado diz que “há males que vêm por bem“, no que está implícito que eles, os males, dão impulso à uma nova oportunidade de repensar os males. Repensar – e buscar soluções.

Por esta razão, transcrevo Chico Adão, no seu livro “Direito Costumeiro e poder tradicional dos povos de Angola.”(pág. 152):
“No âmbito do Direito Penal, tendo em conta as similitudes e dissimilitudes entre o Dto Positivo e o Dto Costumeiro, a escolha varia de acordo com as concepções jurídicas. Entendemos que as sociedades africanas poderiam encontrar um meio-termo entre as duas realidades”.
O autor prossegue: “a inobservância ou desprezo do direito costumeiro tem levado, nalguns países – sobretudo africanos da parte negra do nosso continente- a um desequilíbrio social pautado por preocupações de âmbito do direito em geral.”
A este respeito, abre-se um parêntese, para uma breve observação aproveitando o que escreve o autor a respeito das “percepções jurídicas, para dizer que algumas correntes do pensamento jurídico angolano tendem a apegar-se em demasia á letra da norma, convencidos que “basta conhecer a norma, sabe-se tudo sobre o direito“, esquecidos, porventura, que há vida para além da norma positiva, escrita.
Assiste-se cada vez mais, entre nós, ao passeio de juristas sustentando teses e interpretando o Direito consoante a tinta das suas convicções políticas, abertamente tendenciosas e aberrantes.
Falou-se a propósito deste caso do crime quando é preterintencional, que a circunstância de resultado eficaz da acção ser diverso do que era a intenção primária.
Em primeiro lugar, a nenhuma autoridade é permitida submeter um cidadão a tratamentos penosos ou degradantes – e o Rei não devia equivocar-se a respeito.
Até mesmo porque o Rei, salvo melhor informação, é estudante de Direito.
O que levanta uma questão, relacionada com a primeira, de se saber se o Rei tinha consciência dos danos que poderia, porventura, causar – e que a pena aplicada era degradante para o réu.
O Dr. João Tala afirmou nas Redes Sociais que o réu teve traumatismo abdominal e lesão no pâncreas.
Terceira questão: o Direito Costumeiro é subordinado do Direito Positivo? Cada um faz a sua interpretação de acordo com a sua concepção jurídica.
Na doutrina geral, o Direito Costumeiro é considerado válido e aplicável se não for contra legem – e afectar a dignidade humana.
Por exemplo: se o Rei sentenciou o réu a permanecer ao sol, amarrado e sem direito à água e comida, atentou contra a dignidade humana, nos termos do preceituado no artigo 7 da Constituição.
Para concluir, haverá, porventura, um lado positivo que este caso levanta, primeiro, o debate sobre o poder das autoridades tradicionais e a aplicação do Direito Costumeiro à luz das tradições e valores de justiça praticados nas comunidades, aldeias e reinados.