“TETA” ANGOLANA NÃO SECOU PARA A EURONEWS

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Subestimado pelo Tribunal Supremo, a antiga eurodeputada lusa Ana Gomes voltou a reafirmar o facto de dinheiro público angolano, gerido pelo antigo Gabinete de Revitalização da Comunicação Institucional e Marketing da Administração (GRECIMA), ser usado para pagamentos à estação televisiva pan-europeia “Euronews”.

Em recente entrevista a órgãos de imprensa estrangeiros, em Lisboa, a antiga eurodeputada revelou que continua em vigor o acordo que o Governo de Angola estabeleceu com a Euronews para esta maquiar a imagem do país perante o mundo.

Ana Gomes diz que em ano de eleições em Angola, previstas para o próximo mês de Setembro, a vigência do acordo com a Euronews tem o “potencial de inclinar a balança a favor do MPLA”, o partido que sustenta o Governo de Angola.

Em Abril de 2021, o Tribunal Supremo condenou Manuel Rabelais, antigo director geral do GRECIMA a pena de 14 anos e seis meses sob a acusação de haver cometido crimes de peculato e branqueamento de capitais. Com Rabelais, também foi condenado o seu assistente, Hilário Gaspar Santos, a 10 anos e seis meses de prisão.

O juiz da causa, Daniel Modesto, desvalorizou as reiteradas alegações de Manuel Rabelais segundo as quais o dinheiro que o Gabinete do Presidente da República alocava ao GRECIMA se destinava ao pagamento de operações ocultas do Estado. Nelas se incluíam o acordo com a Euronews para que essa apresentasse ao mundo uma Angola menos “primitiva”.

Daniel Modesto também desvalorizou uma carta do antigo Presidente da República, José Eduardo dos Santos, em que assumia total responsabilidade pelos actos praticados pelo GRECIMA.
Extinto em 2018 pelo Presidente João Lourenço, o GRECIMA deu lugar ao CIPRA, um “viaduto” pelo qual dinheiro de Angola continua a abastecer a Euronews.

Na recente entrevista, a antiga eurodeputada disse que apesar de haver punido o antigo responsável do GRECIMA, o actual Governo de Angola mantém em vigor o acordo celebrado com a estação televisiva pan-europeia nos termos do qual a Euronews divulga notícias favoráveis ao nosso país. 

Ao tempo em que era membro do Parlamento Europeu, Ana Gomes escreveu à alta representante para a política externa, Frederica Mogherini, para lhe manifestar o seu desagrado, depois de ter sido alertada sobre a existência de um contrato vinculando o Governo de Angola com a Euronews.

Ana Gomes deslocou-se expressamente à sede da Euronews, em Lyon, França, e ouviu do director da estação a confirmação da existência de um acordo com o Governo de Angola, assinado em 2017.

Na recente entrevista, Ana Gomes disse-se perturbada com a continuação do acordo. “A mim, incomoda que as autoridades europeias, em particular a Comissão, com a responsabilidade por uma informação isenta e independente, não tenham actuado de forma mais clara para mudar a situação na Euronews”.

Em obediência ao acordo, nas eleições de 2017 a Euronews deu tratamento privilegiado ao candidato do MPLA, João Lourenço.

Aos jornalistas que questionam a sua “colagem” ao Governo de Angola, a direcção da Euronews tem se defendido com o argumento de que “tem acordo de publicidade e patrocínio com mais de 40 governos em todo o mundo”. Ela sustenta que a “promoção do turismo e investimento é o grande sector de publicidade em todos os canais de notícias internacionais e de negócios”. Segundo a Euronews, o acordo com o Governo de Angola “é uma parceria deste género”.

Detida actualmente por um fundo português pertencente a “gente pouco recomendável envolvida em negócios altamente questionáveis”, segundo caracterização de Ana Gomes, a Euronews apresenta ao mundo uma Angola que a totalidade dos angolanos desconhece.

A Angola que a Euronews apresenta é produzida nos estúdios de cinema de ficção”, segundo um observador.

Manuel Rabelais e Hilário dos Santos recorreram das penas aplicadas a ambos.

Dada a sua natureza secreta, Manuel Rabelais disse várias vezes em tribunal que não podia revelar os custos anuais que envolvem o compromisso de Angola com a Euronews, mas entendidos na matéria estimam-nos em vários milhões de dólares.

O antigo director do GRECIMA, bem como Augusto Tomás, o último ministro dos Transportes do Governo de José Eduardo dos Santos são, até agora, a magra “safra” de um programa de luta contra a corrupção que, quando anunciado em 2017 pelo actual Presidente da República pareceu que iria engarrafar todas as cadeias do país.

As cadeias angolanas continuam superlotadas, mas de pilha-galinhas e autores de pequenos delitos de bairro.

Os processos judiciais envolvendo “casca grossa” estão encravados ou na Procuradoria Geral da República ou jazem na secretaria do Tribunal Supremo.

A oito meses do fim do actual mandato do Presidente João Lourenço é duvidoso que outros “tubarões”, que deixaram impressões digitais indeléveis no saque do país, sejam responsabilizados criminalmente pelas suas “façanhas”.