Até tu, Exalgina?

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Uma informação contida na mais recente edição da newsletter Africa Monitor Intelligence sobre uma pretensa movimentação de fundos do Tribunal de Contas de Angola para uma conta privada domiciliada em Portugal deixa a presidente da instituição numa apertadíssima curva.

No seu número  1354, de 09 de Junho, a Africa Monitor Intelligence revela que a Procuradoria Geral da República de Angola teria informado o gabinete do Presidente João Lourenço de que foi “notificada pelas autoridades portuguesas acerca de transferências bancárias de contas do Tribunal de Contas para uma conta privada num banco português, em nome do cidadão angolano Haile Cruz”.

De acordo com a publicação, as referidas operações teriam sido realizadas antes de Maio do ano passado e envolveriam 2,5 milhões de euros e 500 mil dólares.

Às autoridades lusas, que lhe pediram explicações sobre as milionárias operações bancárias, Haile Cruz teria atribuído a propriedade do dinheiro à sua mãe, Exalgina Gamboa.

Exalgina Gamboa é a presidente do Tribunal de Contas de Angola.

De acordo com a AMI,  Haile é filho de Rui Cruz, um fiscalista que preside à Imogestin, imobiliária pretensamente participada pela JALC – Consultores e Prestação de Serviços, Limitada, empresa detida por familiares do Presidente João Lourenço.

A AMI identifica, também, negócios cruzados entre Exalgina Gamboa, presidente do Tribunal de Contas, e a primeira dama de Angola.

Pouco depois de assumir as funções de presidente do Tribunal de Contas, em 2018, Exalgina Gamboa ordenou a abertura de uma conta bancária da instituição no novel e inexpressivo Banco Yetu.

Em Setembro daquele mesmo ano, Haile Cruz, que trabalhava no Banco de Negócios Internacional, juntou-se ao novo Banco Yetu.

Em Maio de 2021, Haile Cruz, administrador para as grandes empresas, incompatibilizou-se com Mário Gavião, presidente da Comissão Executiva do Banco Yetu, e bateu com a porta. Logo depois, os fundos do Tribunal de Contas até aí domiciliados no Banco Yetu foram transferidos para uma conta privada detida por Haile Cruz em Portugal.

Alarmadas com o milionário fluxo de dinheiro na conta de Haile Cruz, as autoridades portuguesas bloquearam-na e deram conta disso às suas homólogas angolanas. O bloqueio e o congelamento do dinheiro que Haile atribui à mãe, mas que, tudo indica, foi desviado do erário angolano, mantiveram-se depois que as autoridades lusas deram como insatisfatórias as explicações dadas pelo filho de Exalgina Gamboa e Rui Cruz.

De acordo com a AMI, em Maio passado  Exalgina Gamboa deslocou-se expressamente a Portugal para tentar desbloquear o dinheiro.

Mal sucedida, Exalgina Gamboa teria, depois, procurado o apoio do Presidente João Lourenço.

Quer Exalgina Gamboa quanto o Tribunal de Contas ainda não reagiram.

O mesmo se passando com a Presidência da República.

O porta-voz da Procuradoria Geral da República, Álvaro João, não reagiu a uma mensagem através da qual o Correio Angolense lhe pediu um comentário à matéria da AMI.

No mesmo dia (quinta-feira) em que a AMI expunha publicamente os contornos do escândalo que envolve a presidente do Tribunal de Contas, o Presidente João Lourenço reafirmava, numa conferência de imprensa em Luanda, a sua determinação de combater a corrupção, não importando os nomes dos implicados.

“(…) a nossa determinação em combater a corrupção é tal que não importa quem sejam os visados”.

A AMI diz existirem “ligações de proximidade entre a Presidente do Tribunal de Contas e o casal presidencial”.

A notícia da AMI afigura-se como uma embaraçosa mancha na carreira de Exalgina Gamboa e reavivou no Presidente João Lourenço a máxima de que, por vezes, o coice parte do mais inesperado dos pontos.

Em vésperas de eleições e numa altura em que calcorreia o país reivindicando retumbantes vitórias na luta contra a corrupção e a impunidade, o pretenso envolvimento da presidente do Tribunal de Contas num desvio de dinheiro público é um enorme balde de água fria despejado sobre o Presidente João Lourenço.