SAÚDE DO PR. PORQUÊ O TABU?

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Descrita como privada, a deslocação do Presidente da República, no dia 23, ao Reino da Espanha, está a suscitar as mais vivas especulações.

Visita privada pode ser associada a férias, passeio, tratamento médico ou outras razões.

Na segunda-feira, 19, o Presidente da República recomendou aos novos membros do Executiva que empossou “trabalhar mais e comunicar melhor”.

O Centro de Imprensa da Presidência da República (CIPRA) é impreciso não só quanto ao verdadeiro propósito da “visita privada”, como é vago no que respeita à sua duração. “Alguns dias”, como é referida, é demasiado vago. Esse é o género de exercício que não se encaixa na recomendação do Presidente da República de “comunicar melhor”.

A deslocação do Presidente da República ao exterior ocorre em meio a imensos rumores sobre o seu estado de saúde.

Poucos dias antes da sua investidura, o Presidente da República esteve na clínica Girassol, onde foi submetido a exaustivos exames médicos. A João Lourenço teria sido diagnosticado um Acidente Isquémico Transitório, traduzido em linguagem popular como acidente vascular ligeiro. 

Da cerimónia da sua investidura, há uma foto do Presidente da República em que alguns médicos identificaram um desvio da comissura labial, que é afecção inflamatória que acomete os cantos da boca.

A ciência médica recomenda investigação detalhada para elucidar os factores predisponentes da comissurite.


À entrada do avião, era visível a imobilidade do braço esquerdo do Presidente da República

No entanto, das imagens de vídeo da sua partida para o Reino de Espanha, três diferentes neurologistas concluíram que o Presidente da República não teria sido acometido apenas por um Acidente Isquémico Transitório.

Aos três especialistas a visível imobilidade do braço esquerdo de João Lourenço sugere uma monoparesia braquial esquerda, que é a diminuição da força muscular do braço esquerdo. Segundo eles, o facto de João Lourenço aparentemente levantar a perna esquerda com dificuldade é uma característica de Acidente Vascular Isquémico, cuja extensão, contudo, só uma Tomografia Computadorizada e Ressonância Magnética podem determinar.

Até à sua investidura, o Presidente João Lourenço conviveu com muitos factores predisponentes de Doença Cérebro Vascular Isquémica, nomeadamente o stress e a fadiga.

À uma extenuante campanha eleitoral, feita em todas as capitais das províncias do país e que dirigiu com a certeza de que o levaria a uma esmagadora vitória, seguiu-se uma angustiante incerteza sobre os resultados e, finalmente, a um desfecho que, desde 1992, tirou a maioria qualificada de 2/3 ao MPLA.

Num mandato que se adivinha muito problemático não apenas pela perda da maioria qualificada na Assembleia Nacional mas, essencialmente, por ser o último, os especialistas recomendam ao Presidente João Lourenço distância de factores que possam conduzir ao ressurgimento de doenças de foro neurológico. Quando ressurgem, os AVC Isquémicos são geralmente de maior grau de gravidade.

Foi um AVC Isquémico que “convenceu” José Eduardo dos Santos a desistir, em 2016, de mais um mandato a que constitucionalmente poderia concorrer. Tomou a decisão depois que esteve sob cuidados médicos especializados em Barcelona durante mais de um mês.

O Presidente João Lourenço tem antecedentes familiares pouco tranquilizadores. Os pais morreram na sequência de AVC. No pai, as sequelas do AVC, provavelmente hemorrágico, deixaram-no em estado vegetativo por muitos anos.

Já se supunham ultrapassados os tempos em que a saúde do Presidente da República era tomada como segredo de Estado ou assunto de foro exclusivamente privado.

Os milhões de angolanos que votaram e não votaram têm todo o direito de ser informados sobre o estado de saúde do Presidente da República. 

Por força da ausência do seu titular, a Presidência da República é interinamente assegurada pela vice-Presidente Esperança Costa, uma pessoa em quem poucos angolanos votariam se as eleições fossem individuais.

É também por isso que se faz urgente quebrar o tabu sobre a saúde do Presidente da República.

Com excepção de avis raras como Núria Lopes e umas poucas, a generalidade dos cidadãos angolanos não toma o Presidente da República como alguém que é imune a doenças.