JL reabilita o “vale dos caídos”

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Com a nomeação de Guilhermina Prata para a embaixada em Paris, o Presidente JL recupera o estatuto que o seu antecessor tinha conferido às representações diplomáticas angolanas: vale dos caídos.

Popularizada pelo saudoso jornalista Aguiar dos Santos, a expressão vale dos caídos significava embaixadas ou empresas públicas onde o antigo Presidente José Eduardo dos Santos encafuava camaradas de partido com os quais andava desavindo (Toca, Kito e outros) ou que não tinham valências para fazer fosse o que fosse. É, também, nas embaixadas que JES “exilava” seus camaradas dobrados pelas doenças associadas à idade. 

Alguns “clemenciados”, que era assim que eram designados antigos dirigentes da FNLA que se renderam à clemência do MPLA, também foram contemplados. 

José Eduardo dos Santos tinha, ainda, nas embaixadas um bom expediente para pagar favores e para acomodar comandantes militares que não tinham homem ou frentes para comandar, e os “inúteis”, geralmente antigos membros do Governo afastados por comprovada incompetência, que lhe batiam insistentemente a porta, pedindo colocação. No auge do monopartidarismo, os indivíduos dispensados do Governo ou Forças Armadas acotovelavam-se em longas filas na sede do “Partido” e no Protocolo de Estado, para implorar colocação a José Eduardo dos Santos.

Porque JES não esperava nada deles, os eleitos para o vale dos caídos não precisavam ter qualquer experiência ou familiaridade com as funções que lhes eram atribuídas. Qualificações académicas razoáveis também não eram assuntos que inquietassem muito o antigo Presidente.

Numa época em que ninguém era afastado por corrupção ou má gestão de bens públicos, a condição de militante do MPLA era garantia bastante para nova “colocação”. 

Seis anos depois de chegar ao poder, o Presidente João Lourenço recupera um paradigma que o seu próprio antecessor já tinha abandonado há bastante tempo.

A nomeação de Guilhermina Prata, uma septuagenária, para a importante embaixada de Paris significa que o actual PR também olha para as nossas representações diplomáticas como meio de pagamento a favores e como lares para pessoas de terceira idade e cujas complicações de saúde, geralmente associadas à geriatria, não encontram alívio em Angola.

Como o seu antecipar, também o actual Presidente da República não parece valorizar os embaixadores de carreira que aguardam, há anos, por colocação.

Ao que tudo indica, os quadros anualmente formados na Academia Venâncio de Moura também não entram nas contas do Presidente João Lourenço.

A nomeação de uma forasteira para a importante embaixada em Paris é mais uma pedra na degradação da imagem externa do país, que já entrou em velocidade cruzeiro após a nomeação de um ministro das Relações Exteriores que está mais para bagageiro do Presidente da República do que para chefe da diplomacia angolana.

Guilhermina Prata vai à embaixada de Angola em França depois de uma actuação indecorosa como juíza conselheira do Tribunal Constitucional. Antes de chegar à Corte, passou pelo Ministério da Justiça, primeira como vice e depois como titular. Foi nessa qualidade que ela, à semelhança de Exalgina Gamboa, no Tribunal de Contas, transformou o Cofre Geral da Justiça num “pote de mel” privativo.

Diz quem sabe, que foi com dinheiro do Cofre Geral da Justiça que Guilhermina Prata comprou duas luxuosas residências para as filhas no Bairro Talatona.

“Um aspirador não limparia melhor o Cofre Geral de Justiça”, segundo ironizou um funcionário do Ministério da Justiça.

À própria Guilhermina Prata a nomeação para embaixadora em França coloca um problema de natureza ética e legal: aceitará ser remunerada nas novas funções?

Juíza jubilada, Guilhermina Prata mantém intactos o salário e outros benefícios a que têm direito todos os membros do Tribunal Constitucional.

Nomeada embaixadora, abrirá mão do respectivo soldo ou, como se diria no linguajar popular, juntará a fome ao desejo de comer, ou seja, aceitará, também, ser remunerada pelo exercício das novas funções?  

Nos termos da lei, o Estado não deve remunerar duplamente um seu servidor.

Embora ensombrados pela passagem pelo Ministério da Justiça, onde lidou com o respectivo Cofre Geral como herança dos seus pais, os favores que fez ao MPLA, enquanto  vice-presidente do Tribunal Constitucional, podem valer a Guilhermina Prata um regime remuneratório especial.